CAPÍTULO VINTE E DOIS

_________________________________________


Fico pálida, meu sangue congela, e o medo me domina o corpo. Instintivamente, dou um passo, colocando-me entre ela e Christian.

— O que é? — murmura Christian num tom cauteloso.

Eu o ignoro. Não posso acreditar que Kate esteja fazendo isso.

— Kate! Você não tem nada a ver com isso. — Cravo meus olhos irados nela, a raiva substituindo o medo.

Como ela se atreve? Não agora, não hoje. Não no aniversário de Christian. Surpresa com a minha reação, ela pisca, os olhos verdes arregalados.

— Ana, o que é? — pergunta Christian de novo, num tom mais ameaçador.

— Christian, você pode sair, por favor? — peço a ele.

— Não. Mostre para mim. — Ele me estende a mão, e sei que não vai aceitar um não como resposta; sua voz é fria e ríspida. Relutante, entrego-lhe o e-mail.

— O que ele fez com você? — pergunta Kate, ignorando Christian. Ela parece muito apreensiva. Uma miríade de imagens eróticas me passa pela cabeça, e eu coro.

— Não é da sua conta, Kate. — Não consigo afastar a exasperação de minha voz.

— Onde você conseguiu isso? — pergunta Christian, a cabeça inclinada de lado, o rosto inexpressivo, mas a voz... tão ameaçadoramente calma. Kate cora.

— Não importa. — Mas, diante de seu olhar de pedra, ela continua apressadamente: — Estava no bolso de um casaco, que imagino que seja seu, que encontrei atrás da porta do quarto de Ana.

Kate titubeia perante o olhar furioso de Christian, mas ela parece se recuperar e fecha a cara para ele.

Em seu vestido vermelho-vivo, ela é um mar de hostilidade. Está deslumbrante. Mas por que diabo andou revirando as minhas roupas? Normalmente sou eu que faço isso.

— Você contou para alguém? — A voz de Christian é como uma luva de seda.

— Não! Claro que não — revida Kate, afrontada.

Christian faz que sim com a cabeça e parece relaxar. Ele se vira e caminha até a lareira. Mudas, eu e Kate o observamos pegar um isqueiro e colocar fogo no e-mail, deixando-o cair lentamente sobre a lenha até desaparecer. O silêncio na sala chega a ser opressivo.

— Nem mesmo para Elliot? — pergunto, voltando a atenção para Kate.

— Ninguém — diz Kate enfaticamente, e pela primeira vez ela parece confusa e magoada. — Só quero saber se você está bem, Ana — sussurra.

— Estou bem, Kate. Mais do que bem. Por favor, Christian e eu estamos bem, muito bem, e isso aí é passado. Por favor, ignore.

— Ignorar? — pergunta. — Como poderia ignorar aquilo? O que ele fez com você? — Seus olhos verdes estão repletos de preocupação sincera.

— Ele não fez nada comigo, Kate. Falando sério, estou bem.

Ela pisca para mim.

— Mesmo? — pergunta.

Christian passa o braço em volta de mim e me puxa para perto de si, sem tirar os olhos de Kate.

— Ana aceitou se casar comigo, Katherine — diz, calmamente.

— Casar! — Kate solta um gritinho, os olhos arregalados, incrédula.

— Isso mesmo. Nós vamos anunciar o noivado hoje à noite — diz ele.

— Ah! — Kate me olha, boquiaberta. Está atordoada. — Eu deixo você sozinha por dezesseis dias, e é isso que acontece? É muito repentino. Então, ontem, quando eu disse... — Ela olha para mim, perdida. — E onde aquele e-mail entra nessa história?

— Não entra, Kate. Esqueça, por favor. Amo Christian, e ele me ama. Não faça isso. Não estrague a festa dele e a nossa noite — sussurro.

Ela pisca e, inesperadamente, seus olhos estão cheios de lágrimas.

— Não. Claro que não. Você está bem? — Ela quer ter certeza.

— Nunca estive tão feliz — sussurro.

Ela se aproxima e agarra a minha mão, apesar de Christian manter o braço ao meu redor.

— Bem mesmo? — pergunta, esperançosa.

— Estou. — Sorrio para ela, minha alegria retornando.

Ela está do meu lado de novo. E sorri para mim, minha felicidade refletindo-se em seu rosto. Saio do abraço de Christian, e ela me abraça de repente.

— Ah, Ana, eu fiquei tão preocupada quando li aquilo. Não sabia o que pensar. Você vai me explicar o que é? — sussurra.

— Um dia, não agora.

— Ótimo. Não vou contar a ninguém. Eu amo tanto você, Ana, como minha própria irmã. Eu só pensei... Eu não sabia o que pensar. Sinto muito. Se você está feliz, então eu estou feliz.

Ela olha diretamente para Christian e repete seu pedido de desculpas. Ele acena para ela, os olhos gélidos, e sua expressão não se altera. Ah, merda, ele ainda está com raiva.

— Eu realmente sinto muito. Você tem razão, não é da minha conta — sussurra ela para mim.

Ouvimos uma batida na porta, e Kate e eu saímos do nosso abraço. Grace enfia a cabeça pela porta.

— Tudo bem, querido? — pergunta a Christian.

— Tudo bem, Sra. Grey — responde Kate imediatamente.

— Tudo bem, mãe — diz Christian.

— Ótimo. — Grace entra. — Então vocês não vão se importar se eu der um abraço de aniversário no meu filho. — Ela sorri para nós, e ele se derrete no mesmo instante e a abraça com força. — Feliz aniversário, querido — diz ela baixinho, fechando os olhos em seu abraço. — Estou tão feliz que você ainda esteja entre nós.

— Mãe, estou bem. — Christian sorri para ela.

Ela se afasta e o olha bem de perto, então sorri.

— Estou tão feliz por você — diz, acariciando seu rosto.

Ele sorri para ela, seu sorriso de mil megawatts.

Ela sabe! Quando foi que ele contou?

— Bem, crianças, se vocês já tiverem terminado a conversa de vocês, tem uma multidão de pessoas aqui para se certificarem de que você está mesmo inteiro, Christian, e para lhe desejar um feliz aniversário.

— Já vou.

Grace olha ansiosa para Kate e para mim, e parece se tranquilizar ao ver nossos sorrisos. Ela dá uma piscadela para mim, mantendo a porta aberta para nós. Christian me estende a mão, e eu a seguro.

— Christian, eu sinto muito, mesmo — diz Kate humildemente. Kate agindo com humildade é algo realmente único. Christian faz que sim para ela, e saímos da sala.

No corredor, olho ansiosa para Christian.

— Sua mãe sabe?

— Sabe.

— Ah.

E pensar que a noite poderia ter sido arruinada pela tenaz Srta. Kavanagh. Tremo só de imaginar: as ramificações do estilo de vida de Christian reveladas a todo mundo.

— Bem, a noite já começou interessante. — Sorrio com gentileza para ele.

Ele se vira para mim, e lá está de novo, seu olhar divertido. Graças a Deus.

— Como sempre, Srta. Steele, você tem um dom para o eufemismo. — Ele leva minha mão aos lábios e beija meus dedos enquanto caminhamos até a sala de estar, onde nos deparamos com uma rodada de aplausos espontânea e ensurdecedora.

Merda. Quantas pessoas foram convidadas?

Corro os olhos pela sala de estar: todos os Grey; Ethan com Mia; Dr. Flynn e sua esposa, imagino; Mac, do barco; um homem bonito, negro e alto que me lembro de ter visto no escritório de Christian quando o conheci; Lily, a amiga chata de Mia; duas mulheres que não reconheço mesmo; e... ah, não. Meu coração afunda. Aquela mulher... A Mrs. Robinson.

Gretchen se materializa com uma bandeja de champanhe. Está usando um vestido decotado preto, o cabelo num penteado alto, em vez das maria-chiquinhas, o rosto corando e os cílios piscando para Christian. Os aplausos se dissipam, e Christian aperta minha mão quando todos os olhos se voltam para ele, em expectativa.

— Obrigado a todos. Parece que vou precisar de uma destas. — Ele pega duas taças da bandeja de Gretchen e lhe abre um breve sorriso. Acho que Gretchen vai ter um troço ou desmaiar.

Ele me entrega uma das taças e ergue a sua para o restante da sala. Imediatamente, todos se aproximam. Liderando o bando vem a malvada mulher de preto. Será que nunca usa outra cor?

— Christian, eu estava tão preocupada. — Elena lhe dá um abraço breve e dois beijinhos. Ele não me solta, apesar de eu tentar liberar minha mão.

— Estou bem, Elena — murmura Christian com frieza.

— Por que você não me ligou? — Sua súplica é desesperada, os olhos examinando os dele.

— Andei ocupado.

— Você não recebeu minhas mensagens?

Christian se move, desconfortável, e me puxa para junto de si, passando o braço ao redor de mim. Seu rosto permanece impassível enquanto ele segue fitando Elena. Ela não pode mais me ignorar, então acena com a cabeça educadamente em minha direção.

— Ana — ronrona. — Você está linda, querida.

— Elena — ronrono de volta. — Obrigada.

Encontro os olhos de Grace. Ela franze a testa, observando-nos.

— Elena, preciso fazer um anúncio — diz Christian, olhando para ela sem emoção.

Seus olhos azul-claros se cobrem, enevoados.

— Claro. — Ela abre um sorriso fingido e dá um passo para trás.

— Pessoal — chama Christian. Ele espera por um momento até que o burburinho na sala tenha se dissipado e todos os olhos estejam mais uma vez sobre ele. — Obrigado a todos por terem vindo. Devo dizer que estava esperando um jantar em família, então esta festa é uma agradável surpresa. — E olha incisivamente para Mia, que sorri e lhe dá um aceno breve.

Christian balança a cabeça, exasperado, e continua.

— Ros e eu... — ele fita a ruiva de pé ao lado de uma moça loura pequena e vivaz — ... passamos um aperto e tanto ontem.

Ah, então essa é a Ros que trabalha com ele. Ela sorri e ergue sua taça para ele. Ele acena para ela.

— Então, estou especialmente feliz por estar aqui hoje para compartilhar com todos vocês uma ótima novidade. Esta linda mulher — ele se vira para mim —, Srta. Anastasia Rose Steele, consentiu em ser minha esposa, e eu gostaria que vocês fossem os primeiros a saber.

Há uma comoção geral, as pessoas vibram, e então mais uma salva de palmas! Puxa, isso está mesmo acontecendo. Acho que estou da cor do vestido de Kate. Christian segura meu queixo, leva meus lábios até os seus e me beija rapidamente.

— Em breve, você será minha.

— Já sou — sussurro.

— Legalmente — ele gesticula com a boca para mim e me abre um sorriso perverso.

Lily, de pé ao lado de Mia, parece cabisbaixa; Gretchen está com uma cara de quem comeu e não gostou. À medida que corro os olhos, ansiosa, pelas pessoas reunidas ali na sala, vejo Elena. Está boquiaberta — horrorizada, eu diria, e não posso conter a pequena, porém intensa satisfação, de vê-la assim estupefata. O que ela está fazendo aqui, afinal?

Carrick e Grace interrompem meus pensamentos muito pouco caridosos, e logo estou sendo abraçada e beijada e passada de mão em mão pelos Grey.

— Ah, Ana, estou tão feliz que você vá passar a fazer parte da família — solta Grace, espontânea. — O tanto que Christian mudou... Ele está... feliz. Sou muito grata a você.

Fico vermelha, envergonhada por sua exuberância, mas secretamente feliz também.

— Cadê a aliança? — exclama Mia, abraçando-me.

— Hum...

A aliança! Caramba. Não tinha nem pensado na aliança. Olho para Christian.

— Vamos escolher juntos. — Christian fecha a cara para ela.

— Ei, não me olhe assim, Grey! — Mia o repreende, e então o envolve em seus braços. — Estou tão feliz por você, Christian — diz.

Ela é a única pessoa que conheço que não se intimida com os olhares carrancudos de Grey. Ele me deixa completamente amedrontada... Bem, certamente me deixava.

— Quando vai ser? Vocês já marcaram a data? — Ela sorri para Christian.

Ele balança a cabeça, sua exasperação palpável.

— Não, não marcamos nada ainda. Ana e eu precisamos discutir tudo isso — diz, irritado.

— Espero que seja um festão, aqui. — Ela sorri entusiasmada, ignorando o tom cáustico do irmão.

— A gente provavelmente vai viajar para Las Vegas amanhã — rosna ele, e é recompensado com uma careta infantil, bem típica de Mia Grey.

Revirando os olhos, ele se vira para Elliot, que lhe dá seu segundo abraço apertado em dois dias.

— Mandou bem, meu irmão. — Ele dá um tapinha nas costas de Christian.

A comoção dos convidados é enorme, e levo alguns minutos até me ver de novo ao lado de Christian, junto do Dr. Flynn. Elena parece ter desaparecido, e Gretchen está enchendo as taças de champanhe, mau-humorada.

Ao lado do Dr. Flynn há uma bela jovem de cabelos longos e muito escuros, quase pretos, um decote impressionante e encantadores olhos castanhos.

— Christian — diz Flynn, estendendo a mão. Christian a aperta, alegremente.

— John. Rhian. — Ele beija a mulher na bochecha. Ela é pequena e bonita.

— Fico feliz que você ainda esteja entre nós, Christian. Minha vida seria muito mais monótona... e pobre, sem você.

Christian sorri.

— John! — Rhian o repreende, para divertimento de Christian.

— Rhian, esta é Anastasia, minha noiva. Ana, esta é a esposa de John.

— Fico muito feliz de conhecer a mulher que finalmente capturou o coração de Christian. — Rhian sorri para mim com gentileza.

— Obrigada — murmuro, envergonhada de novo.

— Foi uma tacada traiçoeira, hein, Christian. — Dr. Flynn balança a cabeça em descrença divertida. Christian franze a testa para ele.

— John, você e as suas metáforas envolvendo críquete. — Rhian revira os olhos. — Parabéns aos dois, e feliz aniversário, Christian. Que presente de aniversário maravilhoso. — Ela sorri para mim.

Não tinha ideia de que o Dr. Flynn estaria aqui, ou Elena. É um choque, e vasculho a cabeça para ver se tenho alguma pergunta a lhe fazer. Mas uma festa de aniversário não parece o local mais apropriado para uma consulta psiquiátrica.

Trocamos amenidades por alguns minutos. Rhian é dona de casa e mãe de dois filhos pequenos. Imagino que ela seja o motivo pelo qual o Dr. Flynn trabalha nos Estados Unidos.

— Ela está bem, Christian, respondendo bem ao tratamento. Mais umas duas semanas e poderemos levar em consideração um tratamento em casa. — Dr. Flynn e Christian mantêm o tom de voz baixo, mas não posso deixar de prestar atenção, deixando grosseiramente de ouvir Rhian.

— Então, agora a minha vida gira em torno de brincadeiras e fraldas...

— Deve tomar muito tempo. — Fico vermelha, voltando a atenção para Rhian, que ri com gentileza. Sei que Christian e Flynn estão falando de Leila.

— Pode perguntar algo a ela por mim? — murmura Christian.

— Então, o que você faz, Anastasia?

— Pode me chamar de Ana, por favor. Trabalho numa editora.

Christian e o Dr. Flynn baixam ainda mais o tom de voz; é tão frustrante. Mas eles interrompem o que estão falando quando as mulheres que não reconheci no início da festa se juntam a nós: Ros e a loura animada que Christian me apresenta como sua companheira, Gwen.

Ros é encantadora, e logo descubro que elas moram quase em frente ao Escala. Ela se derrama em elogios pelas habilidades de piloto de Christian. Aquela havia sido a sua primeira vez em Charlie Tango, e ela diz que nem hesitaria em voar com ele de novo. É uma das poucas mulheres que conheço que não se derrete por ele... bem, a razão é óbvia.

Gwen é risonha e tem um senso de humor irônico, e Christian parece extraordinariamente à vontade com as duas. Ele as conhece muito bem. Eles não discutem sobre trabalho, mas dá para ver que Ros é uma mulher inteligente que pode facilmente acompanhá-lo. Tem também uma ótima risada, grossa e gutural, de quem fuma demais.

Grace interrompe nossa conversa descontraída para avisar a todos que o jantar está sendo servido em estilo buffet, na cozinha. Lentamente, os convidados caminham para os fundos da casa.

No corredor, Mia me agarra pelo pescoço. Em seu vestido de boneca rosa-claro, de alcinhas, e seu salto agulha, ela se pendura em mim como um enfeite de árvore de Natal. Está segurando dois copos de coquetel.

— Ana — sussurra, num tom conspiratório. Ergo o olhar para Christian, que me solta, com uma expressão de “boa sorte, também acho impossível lidar com essa criatura”, e entro na sala de jantar com ela. — Aqui. É um dos martínis de limão especiais do meu pai. Muito mais gostoso do que champanhe. — Ela me entrega uma taça e me encara ansiosa enquanto dou um gole cuidadoso.

— Hum... delicioso. Mas forte. — O que ela quer? Está tentando me embebedar?

— Ana, preciso de alguns conselhos. E não posso pedir a Lily. Ela é tão crítica sobre tudo. — Mia revira os olhos; em seguida, sorri para mim. — Está morrendo de inveja de você. Acho que ela imaginava que um dia Christian e ela pudessem ficar juntos. — Mia desata a rir do absurdo desse pensamento, e, lá dentro, eu me contorço com a ideia.

Isto é algo com o qual vou ter de lutar por muito tempo: outras mulheres cobiçando o meu homem. Afasto o pensamento indesejado e me distraio com o assunto diante de mim. Tomo mais um gole do martíni.

— Posso tentar ajudar você. Diga lá.

— Como você sabe, Ethan e eu nos conhecemos há pouco tempo, graças a você. — Ela sorri, radiante, para mim.

— Certo. — Aonde ela quer chegar com isso?

— Ana, ele não quer sair comigo. — Ela faz beicinho.

— Ah. — Pisco para ela, surpresa, e penso, Talvez você não seja bem o tipo dele.

— Não, falei tudo errado. Ele não quer sair comigo porque a irmã dele está saindo com o meu irmão. Sabe, ele acha que é uma situação meio que incestuosa. Mas eu sei que ele gosta de mim. O que eu faço?

— Ah, entendi — balbucio, tentando ganhar tempo. O que eu posso dizer? — Será que não dá para seguir como amigos e dar um tempo a ele? Quero dizer, vocês acabaram de se conhecer.

Ela ergue uma sobrancelha.

— Olha, eu sei que eu também acabei de conhecer Christian, mas... — Faço uma careta para ela, sem saber bem o que quero dizer. — Mia, isso é uma coisa que você e Ethan vão ter que resolver juntos. Eu tentaria o caminho da amizade.

Mia sorri.

— Você aprendeu esse olhar com Christian.

Eu coro.

— Se você quer um conselho, pergunte a Kate. Ela pode ter alguma ideia sobre como o irmão se sente.

— Você acha? — pergunta Mia.

— Acho. — Sorrio, encorajando-a.

— Legal. Obrigada, Ana.

Ela me dá mais um abraço e deixa a sala de jantar, toda saltitante — o que, diga-se de passagem, com aqueles saltos, é algo impressionante —, sem dúvida indo direto perturbar Kate. Tomo mais um gole do martíni e estou prestes a sair atrás dela quando fico paralisada.

Elena adentra a sala devagar, o rosto tenso, com uma determinação sombria e raivosa. Ela fecha a porta silenciosamente atrás de si e fecha a cara para mim.

Ah, droga.

— Ana — rosna ela.

Tento reunir todo o meu autocontrole, ligeiramente zonza depois de dois copos de champanhe e o coquetel letal que tenho em mãos. Acho que o sangue me fugiu todo do rosto, mas convoco tanto o meu inconsciente quanto minha deusa interior para tentar parecer o mais calma e equilibrada possível.

— Elena. — Minha voz é baixa, mas firme, apesar de minha boca estar seca. Por que essa mulher me assusta tanto assim? E o que ela quer agora?

— Eu lhe daria meus sinceros parabéns, mas acho que seria inapropriado. — Seus penetrantes e gélidos olhos azuis se fixam nos meus, repletos de repugnância.

— Não quero os seus parabéns, nem preciso deles, Elena. Estou surpresa e decepcionada de vê-la aqui.

Ela arqueia uma sobrancelha. Acho que está impressionada.

— Não teria pensado em você como uma adversária à altura, Anastasia. Mas você me surpreende a cada instante.

— Eu simplesmente não pensei em você — minto, friamente. Christian ficaria orgulhoso. — Agora, se me dá licença, tenho coisas muito melhores a fazer do que perder meu tempo com você.

— Não tão rápido, mocinha — sussurra ela, recostando-se contra a porta e bloqueando minha saída. — Que diabo você pensa que está fazendo, concordando em se casar com Christian? Se você acha por um minuto que é capaz de fazê-lo feliz, está muito enganada.

— O que eu concordei em fazer com Christian não é da sua conta. — Sorrio com uma doçura sarcástica. Ela me ignora.

— Ele tem necessidades, necessidades que você não pode nem começar a satisfazer — ela gaba-se.

— O que você sabe das necessidades dele? — rosno. Meu sentido de indignação explode violento, queimando dentro de mim à medida que uma onda de adrenalina me atravessa o corpo. Como essa vagabunda de merda ousa passar sermão em mim? — Você não passa de uma doente que abusa de crianças, e, se dependesse de mim, eu jogava você no sétimo círculo do inferno e ia embora sorrindo. Agora saia da minha frente, ou vou ter que arrancar você?

— Você está cometendo um grande erro aqui, mocinha. — Ela balança o indicador longo e magro para mim, a unha muito bem-feita. — Como você se atreve a julgar o nosso estilo de vida? Você não sabe de nada, você não tem ideia de onde está se metendo. E se você acha que ele vai ser feliz com uma garotinha tímida e oportunista, que só pensa em dinheiro, feito você...

Já chega! Atiro o restante do meu martíni de limão na cara dela, deixando-a encharcada.

— Não ouse me dizer onde estou me metendo! — grito para ela. — Quando você vai aprender? Não é da sua conta!

Ela me encara embasbacada, o horror estampado no olhar, e limpa a bebida pegajosa do rosto. Acho que está prestes a avançar para cima de mim, mas é empurrada para o lado, de repente, quando a porta se abre.

De pé, junto à porta, está Christian. Ele leva um milésimo de segundo para avaliar a situação: eu, pálida e tremendo; ela, encharcada e lívida. Seu belo rosto escurece e se contorce de raiva enquanto ele se aproxima, parando entre nós duas.

— Que merda que você está fazendo, Elena? — diz.

Sua voz é glacial e repleta de ameaça.

Ela pisca para ele.

— Ela não é a pessoa certa para você, Christian — sussurra.

— O quê? — grita ele, assustando a nós duas. Não posso ver seu rosto, mas todo o seu corpo está tenso, e ele irradia animosidade. — E quem é você para saber o que é certo para mim?

— Você tem necessidades, Christian — diz ela, a voz mais suave.

— Já falei: isso não é da sua conta, porra! — ruge ele.

Merda: o Christian Muito Bravo deu as caras nada feias aliás. As pessoas vão acabar ouvindo.

— Qual é o seu problema? — Ele faz uma pausa, olhando para ela. — Você acha que é você? Você? Acha que você é a pessoa certa para mim? — Ele acalma a voz, mas ela está carregada de desprezo.

E, de repente, não quero estar aqui. Não quero testemunhar esse encontro íntimo. Sinto-me uma intrusa. Mas estou paralisada... meus membros incapazes de se mover.

Elena engole em seco e parece erguer o corpo. Sua postura muda sutilmente, tornando-se mais imponente, e ela dá um passo na direção dele.

— Eu fui a melhor coisa que já aconteceu na sua vida — rebate ela, arrogante. — Olhe só para você agora. Um dos empresários mais ricos e mais bem-sucedidos dos Estados Unidos, controlado, obstinado, você não precisa de nada. Você é o mestre do seu universo.

Ele dá um passo para trás, como se tivesse levado um golpe, e a encara, boquiaberto de descrença e indignação.

— Você adorava, Christian, não tente enganar a si mesmo. Você estava no caminho da autodestruição, e eu o salvei, salvei você de passar a vida atrás das grades. Acredite em mim, meu bem, é lá que você teria acabado. Eu ensinei a você tudo o que você sabe, tudo de que você precisa.

Christian fica branco, encarando-a horrorizado. Ao falar, sua voz é baixa e incrédula.

— Você me ensinou a foder, Elena. Mas isso é vazio, vazio como você. Não me admira que Linc tenha ido embora.

A bile me vem até a boca. Eu não deveria estar aqui. Mas estou congelada no mesmo ponto, morbidamente fascinada enquanto eles se atacam.

— Você nunca me abraçou — sussurra Christian. — Você nunca disse que me amava.

Ela estreita os olhos.

— O amor é para os tolos, Christian.

— Saia da minha casa. — A voz furiosa e implacável de Grace assusta a todos nós, e viramos a cabeça rapidamente para onde ela está, sob o umbral da porta. Está encarando Elena, que empalidece sob seu bronzeado de Saint-Tropez.

O tempo parece parar enquanto nós três respiramos fundo, e Grace entra, determinada, na sala. Seus olhos estão ardendo de raiva, sem se desviar de Elena, até que está diante dela. Elena arregala os olhos de susto, e Grace lhe dá um tapa com força no rosto, o som do impacto reverberando nas paredes da sala de jantar.

— Tire as patas imundas do meu filho, sua vadia, e saia da minha casa. Agora! — sussurra por entre os dentes.

Elena leva a mão até o rosto vermelho e encara Grace horrorizada, chocada, piscando para ela. Em seguida, corre para fora da sala, sem se preocupar em fechar a porta atrás de si.

Grace vira-se lentamente para Christian e um silêncio tenso se instala feito um cobertor grosso sobre nós quando os dois encaram um ao outro. Depois de um tempo, Grace fala.

— Ana, antes que eu o entregue a você, você se importaria de me dar um minuto ou dois a sós com meu filho? — Sua voz é calma, rouca, mas poderosa.

— Claro — sussurro e saio da sala o mais rápido que posso, dando uma olhada rápida e ansiosa por cima do ombro.

Mas nenhum dos dois se vira para me ver sair. Eles continuam a se encarar, com todas as palavras não ditas praticamente berrando entre eles.

No corredor, vejo-me perdida por um instante. Meu coração está pulando, e o meu sangue dispara pelas minhas veias... Estou em pânico, isso tudo é muito mais do que posso compreender. Deus do céu, aquilo foi pesado, e agora Grace sabe. Não consigo imaginar o que ela vai dizer a Christian, e sei que é errado, mas me inclino contra a porta, tentando ouvir.

— Por quanto tempo, Christian? — A voz de Grace é baixa. Mal posso ouvi-la. Não consigo escutar a resposta dele. — Quantos anos você tinha? — A voz dela é mais insistente. — Diga-me. Quantos anos você tinha quando tudo isso começou? — Mais uma vez não posso ouvir Christian.

— Está tudo bem, Ana? — Ros me interrompe.

— Tudo. Tudo bem. Obrigada. Eu...

— Só estou indo pegar minha bolsa — Ros sorri. — Preciso de um cigarro.

Por um breve momento, avalio a possibilidade de me juntar a ela.

— Estou indo ao banheiro.

Preciso recobrar meu juízo e meus pensamentos, para processar o que acabei de testemunhar e ouvir. A parte de cima da casa parece ser o lugar mais seguro para ficar sozinha. Assisto Ros caminhar até a sala de estar e subo, dois degraus de cada vez, até o segundo andar, e então continuo até o terceiro. Só tem um lugar em que quero estar.

Abro a porta do quarto de infância de Christian e a fecho atrás de mim, inspirando profundamente. Caminho até a sua cama, jogo-me em cima dela e fico encarando o teto branco e liso.

Minha nossa. Este deve ser, sem dúvida, um dos confrontos mais excruciantes que já tive de suportar, e agora me sinto entorpecida. Meu noivo e sua ex-amante — nenhuma noiva deveria ter que passar por isso. Dito isto, parte de mim está feliz que ela tenha revelado sua verdadeira faceta, e que eu estivesse lá para testemunhar.

Meus pensamentos se voltam para Grace. Pobre Grace, ter que ouvir aquilo tudo. Agarro um dos travesseiros de Christian. Ela deve ter ouvido que Christian e Elena tiveram um caso, mas não a natureza dele. Graças a Deus. Solto um gemido.

O que estou fazendo? Talvez a bruxa má não deixe de ter alguma razão.

Não, me recuso a acreditar nisso. Ela é tão fria e cruel. Balanço a cabeça. Ela está errada. Eu sou a pessoa certa para Christian. Sou tudo de que ele precisa. E, num momento impressionante de lucidez, não me pergunto como ele viveu a vida que viveu até recentemente, mas por quê. As razões para fazer o que fez com inúmeras garotas — nem quero saber com quantas. O como não é o problema. Todas elas eram adultas. Eram — como foi que Flynn colocou? — pessoas participando de um relacionamento consensual, seguro e saudável. O problema é o porquê. O porquê estava errado. O porquê é que vem de um lugar sombrio.

Fecho os olhos e coloco o braço sobre eles. Mas agora ele seguiu em frente, deixou tudo isso para trás, e ambos estamos na luz. Estou encantada por ele, e ele por mim. Podemos guiar um ao outro. Um pensamento me ocorre. Merda! Um pensamento perturbador e traiçoeiro, e estou no único lugar em que posso exorcizar esse fantasma. Sento-me na cama. Sim, preciso fazer isso.

Fico de pé, tremendo, tiro os sapatos, caminho até sua escrivaninha e observo o mural acima dela. As fotos do jovem Christian ainda estão lá — mais pungentes do que nunca, depois do espetáculo que acabei de testemunhar entre ele e a Mrs. Robinson. E lá está, no canto, o pequeno retrato em preto e branco: sua mãe, a prostituta viciada.

Acendo a lâmpada da mesa e viro o foco de luz para a fotografia. Nem sei o seu nome. Ela se parece muito com ele, só que mais jovem e mais triste, e, olhando para seu rosto infeliz, tudo o que sinto é compaixão. Tento ver as semelhanças entre aquele rosto e o meu. Aperto os olhos diante da imagem, chegando bem perto, e não identifico nenhuma. Exceto, talvez, o cabelo, mas acho que o dela é mais claro que o meu. Não me pareço nem um pouco com ela. É um alívio.

Meu inconsciente se vira para mim, fazendo um barulhinho de desaprovação, os braços cruzados, encarando-me por sobre os óculos de meia-lua. Por que você está se torturando? Você já disse sim. Você fez a fama, agora deite na cama. Contraio os lábios para ele. Sim, com muito prazer. Quero me deitar nesta cama com Christian para o resto da vida. Sentada na posição de lótus, minha deusa interior sorri serenamente. Sim. Tomei a decisão certa.

Tenho que encontrá-lo — Christian deve estar preocupado. Não tenho ideia de quanto tempo passei no quarto dele; ele vai achar que eu fugi. Reviro os olhos ao imaginar sua reação exagerada. Espero que ele e Grace tenham terminado a conversa. Estremeço só de pensar no que mais ela pode ter dito a ele.

Encontro Christian subindo as escadas para o segundo andar, procurando por mim. Seu rosto está tenso e cansado — não é o mesmo Cinquenta Tons despreocupado com quem cheguei aqui. Permaneço no topo da escada, e ele para num dos degraus, de modo que ficamos olhos nos olhos.

— Oi — diz, com cautela.

— Oi — respondo, contida.

— Estava preocupado com...

— Eu sei — interrompo-o. — Me desculpe, não estava em condições de enfrentar a comemoração. Só precisava sair um pouco, você sabe. Para pensar.

Acaricio seu rosto. Ele fecha os olhos e inclina o rosto contra a minha mão.

— E você achou que seria uma boa ideia fazer isso no meu quarto?

— É.

Ele pega a minha mão e me puxa para um abraço, que eu aceito de bom grado, meu lugar favorito no mundo inteiro. Tem cheiro de roupa limpa, loção de banho e de Christian — o perfume mais relaxante e excitante do planeta. Ele inspira fundo, o nariz no meu cabelo.

— Sinto muito que você tenha tido que passar por isso.

— Não é sua culpa, Christian. Por que ela estava aqui?

Ele me olha, a boca se contorcendo num pedido de desculpas.

— É amiga da família.

Tento não reagir.

— Não é mais. Como está sua mãe?

— Mamãe está muito brava comigo neste instante. Estou muito feliz que você esteja aqui, e que a gente esteja no meio de uma festa. Caso contrário, estes poderiam ser meus últimos momentos de vida.

— Grave assim, é?

Ele faz que sim com a cabeça, os olhos sérios, e sinto sua perplexidade diante da reação dela.

— E você pode culpá-la por isso? — minha voz é calma, lisonjeira.

Ele me abraça com força e parece incerto, processando seus pensamentos. Enfim, responde:

— Não.

Uau! Um progresso e tanto.

— A gente pode se sentar? — pergunto.

— Claro. Aqui?

Concordo com a cabeça, e nos sentamos no alto da escada.

— Então, como você está se sentindo? — pergunto, segurando sua mão ansiosamente e fitando seu rosto triste e sério.

Ele suspira.

— Sinto-me libertado. — Christian dá de ombros e então sorri seu sorriso maravilhoso e despreocupado, fazendo desaparecer todo o cansaço e a tensão de instantes atrás.

— Sério? — Sorrio de volta para ele. Uau, eu seria capaz de rastejar sobre cacos de vidro por esse sorriso.

— Nossa relação de negócios acabou. Chega.

Franzo a testa.

— Você vai fechar o salão de beleza?

Ele ri com desdém.

— Não sou tão vingativo, Anastasia — repreende-me. — Não. Vou deixar tudo para ela. Na segunda-feira, eu falo com meu advogado. Devo isso a ela.

Arqueio uma sobrancelha para ele.

— Então, chega de Mrs. Robinson?

Ele contorce a boca, divertido, e balança a cabeça.

— Chega.

Sorrio.

— Sinto muito que você tenha perdido uma amiga.

Ele dá de ombros, em seguida, sorri.

— Sente, é?

— Não — confesso, ficando vermelha.

— Venha. — Ele se levanta e me oferece a mão. — Vamos voltar para a festa em nossa homenagem. Talvez eu até me embebede.

— E você por acaso fica bêbado? — pergunto ao segurar sua mão.

— Não desde que era um adolescente selvagem. — Descemos as escadas. — Você comeu? — pergunta ele.

Ah, droga.

— Não.

— Pois deveria. Pela aparência e pelo cheiro de Elena, aquilo que você jogou nela era um dos coquetéis letais do meu pai. — Ele me olha, tentando afastar o humor de seu rosto, e falhando miseravelmente.

— Christian, eu...

Ele ergue a mão para mim.

— Não tem discussão, Anastasia. Se for para beber e jogar álcool nas minhas ex, então você tem que comer. É a regra número um. Acho que já tivemos essa discussão depois da nossa primeira noite juntos.

Ah, sim. No Heathman.

De volta ao corredor, ele para e acaricia meu rosto, seus dedos deslizando ao longo do meu queixo.

— Fiquei acordado durante horas, assistindo você dormir — murmura. — Talvez eu já amasse você então.

Ah.

Ele se inclina e me beija com carinho, e eu me derreto toda por dentro, a tensão da última hora se esvaindo languidamente de meu corpo.

— Coma — sussurra.

— Certo — aquiesço, porque, neste instante, acho que poderia fazer qualquer coisa por ele. Segurando a minha mão, ele me leva até a cozinha, onde a festa segue a toda.

* * *

— TCHAU, JOHN. Boa noite, Rhian.

— Parabéns mais uma vez, Ana. Vocês vão ficar bem. — Dr. Flynn sorri gentilmente para nós, enquanto caminhamos lado a lado pelo corredor para nos despedir dele e de Rhian.

— Boa noite.

Christian fecha a porta e balança a cabeça. Ele me fita, de repente, os olhos brilhando de excitação.

O que foi?

— Só sobrou a família. Acho que minha mãe passou um pouco da conta na bebida. — Grace está cantando karaokê na sala de jogos. E Kate e Mia estão competindo com ela arduamente.

— E você a culpa por isso? — Sorrio para ele, tentando manter o clima leve entre nós. Funciona.

— Você está rindo de mim, Srta. Steele?

— Estou.

— Foi um dia cheio.

— Christian, ultimamente, todos os dias com você têm sido cheios. — Minha voz é sarcástica.

Ele balança a cabeça.

— Muito bem colocado, Srta. Steele. Venha, quero lhe mostrar uma coisa.

Segurando a minha mão, ele me leva até a cozinha, onde Carrick, Ethan e Elliot estão conversando sobre os Mariners, bebendo os últimos drinques e comendo as sobras da comida da festa.

— Vão dar um passeio? — Elliot provoca sugestivamente assim que atravessamos as portas para o jardim. Christian o ignora. Carrick franze a testa para Elliot, sacudindo a cabeça numa reprovação silenciosa.

À medida que descemos os degraus até o gramado, tiro os sapatos. Uma lua crescente reluz sobre a baía. Está muito brilhante, mergulhando tudo em inúmeros tons de cinza ​​enquanto as luzes de Seattle piscam a distância. As lâmpadas do ancoradouro estão acesas, um farol suave cintilando sob o brilho frio da lua.

— Christian, eu gostaria de ir à igreja amanhã.

— Ah?

— Rezei para que você voltasse vivo, e você voltou. É o mínimo que posso fazer.

— Está bem.

Caminhamos de mãos dadas num silêncio relaxado por alguns momentos. Então, algo me passa pela cabeça.

— Onde você vai colocar as fotos que José tirou de mim?

— Achei que a gente poderia colocar na casa nova.

— Você comprou a casa?

Ele para e me olha, a voz cheia de preocupação.

— Comprei. Achei que você tivesse gostado dela.

— E gostei. Quando você comprou?

— Ontem de manhã. Agora a gente precisa decidir o que fazer com ela — murmura, aliviado.

— Não a derrube. Por favor. É uma casa tão linda. Só precisa de um pouco de amor e carinho.

Christian olha para mim e sorri.

— Certo. Vou falar com Elliot. Ele conhece uma arquiteta muito boa, ela fez umas obras na minha casa de Aspen. E ele pode cuidar da renovação.

Rio de repente, lembrando-me da última vez em que atravessamos esse gramado sob o luar até o ancoradouro. Ah, talvez seja para lá que estamos indo agora. Sorrio.

— O que foi?

— Estou me lembrando da última vez em que você me levou até o ancoradouro.

— Ah, aquilo foi divertido. — Christian ri baixinho. — Aliás... — Ele para de repente e me coloca no ombro, embora não estejamos muito longe. Solto um gritinho.

— Se me lembro bem, você estava com muita raiva — ofego.

— Anastasia, sempre estou com muita raiva.

— Não, não é verdade.

Ele me dá um tapa na bunda assim que para diante da porta de madeira. Então me coloca no chão, deslizando-me sobre o seu corpo, e segura minha cabeça entre as mãos.

— Não, não mais.

Abaixando-se, ele me beija com força. Quando se afasta, estou ofegante e o desejo vara o meu corpo.

Ele me olha, e, sob o brilho do raio de luz que vem de dentro do ancoradouro, vejo que está ansioso. Meu homem ansioso, não um cavaleiro branco ou um cavaleiro das trevas, mas um homem — um homem lindo, e não tão complicado assim — a quem amo. Acaricio seu rosto, correndo os dedos por suas costeletas e ao longo de sua mandíbula até o queixo; em seguida, deixo meu indicador tocar seus lábios. Ele relaxa.

— Tenho uma coisa pra mostrar a você aí dentro — murmura e abre a porta.

A luz dura das lâmpadas fluorescentes ilumina a impressionante lancha atracada no cais, balançando de mansinho na água escura. Ao lado dela, há um barco a remo.

— Venha.

Christian pega a minha mão e me conduz pelos degraus de madeira. Abrindo a porta no topo da escada, ele se afasta para que eu entre.

Fico boquiaberta. O sótão está irreconhecível, inteiramente coberto de flores... flores por todos os cantos. Alguém criou uma câmara mágica, repleta de belas flores do campo, luzes de Natal e pequenas lanternas de papel que lançam um brilho suave e pálido por todo o ambiente.

Viro o rosto para ele, e ele está me observando, a expressão ilegível. Então, dá de ombros.

— Você queria flores e corações — murmura.

Eu pisco para ele, sem acreditar no que estou vendo.

— Você tem meu coração.

E então ele acena em direção ao cômodo.

— E aqui estão as flores — sussurro, completando sua frase. — Christian, é lindo. — Não consigo pensar em mais nada para dizer. Meu coração pula até a boca, e as lágrimas ardem em meus olhos.

Segurando minha mão, ele me puxa para dentro do quarto, e antes que eu perceba, está com um dos joelhos no chão, na minha frente. Minha nossa... Por essa eu não esperava! Prendo a respiração.

Ele retira uma aliança do bolso interno do casaco e ergue o olhar para mim, os olhos brilhantes, cinzentos e inchados, repletos de emoção.

— Anastasia Steele. Eu amo você. Quero amar, adorar e proteger você para o resto da minha vida. Seja minha. Para sempre. Divida minha vida comigo. Case comigo.

Pisco para ele e as lágrimas me escorrem pelo rosto. Meu Cinquenta Tons, meu homem. Eu o amo tanto, e tudo o que posso dizer em meio à onda de emoção que me invade é:

— Sim.

Ele sorri, aliviado, e, lentamente, desliza a aliança pelo meu dedo. É linda, um diamante oval num anel de platina. Uau, o diamante é enorme... Grande, mas simples e deslumbrante em sua simplicidade.

— Ah, Christian — soluço, tomada de súbito pela alegria.

Fico de joelhos diante dele, os dedos em seus cabelos, e o beijo, com todo o meu coração e toda a minha alma. Beijo esse homem lindo, que me ama da mesma forma que eu o amo; e ele me envolve em seus braços, suas mãos subindo até os meus cabelos, sua boca na minha. Sei, no fundo, que sempre serei sua, e ele sempre será meu. Percorremos um longo caminho juntos, e ainda temos muito que caminhar, mas somos feitos um para o outro. Somos almas gêmeas.

z

A ponta do cigarro brilha intensamente na escuridão à medida que ele dá uma longa tragada. Solta a fumaça numa longa exalação, terminando com dois anéis que dissolvem diante de si, pálidos e fantasmagóricos sob o luar. Ele se ajeita em seu assento, entediado, e dá um gole rápido de bourbon barato direto do gargalo da garrafa embrulhada em papel pardo amassado, antes de descansá-la de novo entre as coxas.

Mal pode acreditar que ele continue cruzando seu caminho. Sua boca se contorce num riso desdenhoso e sarcástico. O helicóptero fora uma jogada precipitada e ousada. Uma das coisas mais emocionantes que já fizera na vida. Mas não deu certo. Ele revira os olhos com ironia. Quem diria que o filho da puta saberia pilotar aquela merda de verdade?

Ele bufa.

Eles o subestimaram. Se Grey pensou por um instante que ele iria se recolher sob o crepúsculo, choramingando baixinho, aquele babaca não sabia de nada.

Sua vida toda, foi a mesma coisa. As pessoas constantemente o subestimando — só um homem que lê livros. Que se fodam! Um homem com uma memória fotográfica que lê livros. Ah, as coisas que ele aprendeu, as coisas que ele sabe. Ele bufa de novo. Sim, Grey, a seu respeito. As coisas que sei sobre você.

Nada mal para um garoto de um fim de mundo de Detroit.

Nada mal para um garoto que conseguiu uma bolsa de estudos em Princeton.

Nada mal para um garoto que se matou de trabalhar durante toda a faculdade e acabou entrando no mercado editorial.

E agora tudo isso foi por água abaixo, tudo por causa de Grey e daquela vadia dele. Ele franze a testa diante da casa, como se ela representasse tudo o que ele mais despreza. Mas não há nada a fazer. A única confusão é uma loura peituda, toda de preto, cambaleando até a garagem aos prantos antes de entrar num Mercedes-Benz branco e picar a mula.

Ele dá uma gargalhada e estremece. Merda, suas costelas. Ainda estão doloridas do chute ligeiro do capanga de Grey.

Ele reconstrói a cena em sua mente. “Encoste um dedo na Srta. Steele de novo, e eu mato você.”

Aquele filho da puta também vai ter o que merece. É, ele vai ver só.

Ele se recosta contra o banco do carro. Parece que a noite vai ser longa. Mas não vai a lugar nenhum, vai ficar ali, observando e esperando. Dá outro trago em seu Marlboro vermelho. Sua hora vai chegar. Sua hora vai chegar em breve.

Загрузка...