CAPÍTULO DEZESSEIS

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Aos poucos o mundo exterior invade meus sentidos e, minha nossa, que invasão. Estou flutuando, pernas e braços moles e lânguidos, absolutamente esgotada. Estou deitada por cima dele, a cabeça em seu peito, e ele tem um cheiro divino: um aroma de roupa de cama recém-lavada misturado com sabonete caro: o melhor e mais sedutor perfume do planeta... Christian. Não quero me mexer, quero respirar esse elixir para sempre. Esfrego o nariz nele, desejando não ter a barreira da sua camisa. E, à medida que o restante do meu corpo vai voltando à razão, ponho a mão em seu peito. É a primeira vez que o toco ali. É firme... forte. Ele automaticamente agarra minha mão, mas suaviza o golpe puxando-a até os lábios e beijando meus dedos com doçura. Vira-se, e fica me olhando.

— Não — murmura, e me dá um leve beijo.

— Por que você não gosta de ser tocado? — sussurro, olhando para seus meigos olhos cinzentos.

— Porque sou cinquenta vezes fodido, de cinquenta maneiras, cinquenta tons diferentes, Anastasia.

Ah... essa honestidade me desarma completamente. Pisco para ele.

— Tive um começo de vida muito duro. Não quero sobrecarregar você com os detalhes. Só não faça.

Ele esfrega o nariz no meu, sai de dentro de mim e se senta.

— Acho que já percorremos todos os pontos básicos. Que tal?

Christian parece totalmente satisfeito e, ao mesmo tempo, fala num tom impassível, como se tivesse acabado de riscar mais um item de uma lista. Continuo tonta com o comentário sobre o seu “começo de vida muito duro”. É muito frustrante — estou louca para saber mais. Mas ele não vai me contar. Inclino a cabeça de lado, imitando o jeito dele, e faço um esforço enorme para esboçar um sorriso.

— Se você acha que acreditei que você me cedeu o controle, bem, então você não levou em conta minhas boas notas. — Sorrio timidamente para ele. — Mas obrigada pela ilusão.

— Srta. Steele, você não é só um rosto bonito. Você já teve seis orgasmos e todos eles pertencem a mim — gaba-se, de novo, com um gracejo.

Enrubesço e pisco ao mesmo tempo, enquanto ele me olha. Ele está contando! Ele franze as sobrancelhas.

— Você tem alguma coisa para me contar? — pergunta com a voz séria.

Franzo o cenho. Droga.

Eu tive um sonho hoje de manhã.

— É? — Ele me olha espantado.

Puta merda. Será que arranjei problema?

— Gozei dormindo.

Tapo os olhos com o braço. Ele não diz nada. Olho para ele por baixo do braço, e ele parece achar graça.

— Dormindo?

— Quando gozei, acordei.

— Tenho certeza que acordou. Estava sonhando com o quê?

Droga.

— Com você.

— O que eu estava fazendo?

Torno a tapar os olhos com o braço. E, como uma criancinha, por um instante acho que, se não posso vê-lo, ele também não pode me ver.

— Anastasia, o que eu estava fazendo? Não vou perguntar de novo.

— Você estava com um chicote de montaria.

Ele se remexe e isso balança meu braço.

— É mesmo?

— É.

Estou completamente vermelha.

— Ainda há esperança para você — diz ele, baixinho. — Tenho vários chicotes de montaria.

— De couro marrom trançado?

Ele ri.

— Não, mas garanto que poderia arranjar um.

Ele se inclina e me dá um beijo rápido. Depois se levanta e pega a cueca. Ah, não... ele está indo embora. Lanço um olhar rápido para o relógio: são só nove e quarenta. Levanto-me depressa também, pego a calça de moletom e uma camiseta de alcinha, e aí torno a me sentar na cama, de pernas cruzadas, observando-o. Não quero que ele vá embora. O que posso fazer?

— Quando você vai ficar menstruada? — Ele interrompe meus pensamentos.

O quê?

Odeio usar essas coisas — resmunga ele. Mostra a camisinha, depois a joga no chão e veste as calças. — Quando? — provoca quando não respondo, me olhando como se estivesse aguardando minha opinião sobre o tempo.

Puta merda... isso é assunto pessoal.

— Semana que vem.

Fico olhando para baixo.

— Você precisa arranjar um anticoncepcional.

Ele é muito autoritário. Fico olhando-o impassível. Ele se senta na cama de novo para calçar os sapatos e as meias.

— Você tem uma consulta médica marcada?

Balanço a cabeça, negando. Voltamos às fusões e aquisições — outra mudança de humor de cento e oitenta graus.

Ele franze a testa.

— Posso marcar para você na sua casa. Domingo de manhã, antes de você ir me ver. Ou pode ser na minha. O que prefere?

Nada de pressão, então. Mais uma coisa que ele está pagando... mas, na verdade, é para proveito dele.

— Na sua casa.

Isso significa que é garantido que eu saia com ele domingo.

— Tudo bem. Eu aviso o horário.

— Você está indo embora?

Não vá... fique comigo, por favor.

— Estou.

Por quê?

— Como você vai voltar? — sussurro.

— Taylor vem me pegar.

— Posso levá-lo de carro. Tenho um carro lindo.

Ele me olha com uma expressão carinhosa.

— Está melhorando. Mas acho que você bebeu demais.

— Você me deixou bêbada de propósito?

— Deixei.

— Por quê?

— Porque você pensa demais, e é reticente como seu padrasto. Com uma gota de vinho você já desanda a falar, e preciso que se comunique honestamente comigo. Do contrário, você se fecha e não tenho ideia do que está pensando. In vino veritas, Anastasia.

— E você acha que é sempre honesto comigo?

— Eu me esforço para ser. — Ele me olha com cautela. — Isso só vai funcionar se formos honestos um com o outro.

— Eu gostaria que você ficasse e usasse isto.

Mostro a outra camisinha.

Ele sorri, os olhos brilhando cheios de humor.

— Anastasia, já saí vezes demais da linha aqui hoje. Tenho que ir. Vejo você no domingo. Vou mandar preparar o contrato revisto, e aí a gente pode realmente começar a brincadeira.

— Brincadeira?

Puta merda. Meu coração vem parar na boca.

— Eu gostaria de fazer uma cena com você. Mas não quero que seja antes de você assinar, e eu saber que está preparada.

— Ah, então posso prolongar isso se não assinar?

Ele olha para mim, me avaliando, e sorri.

— Bem, acho que sim, mas talvez eu não aguente a pressão e estoure.

— Estoure? Como?

Minha deusa interior acordou e está alerta.

Ele balança a cabeça devagar, depois sorri, provocando.

— A coisa pode ficar muito feia.

Seu sorriso é contagioso.

— Feia como?

— Ah, você sabe, explosões, perseguição de carro, sequestro, cárcere privado.

— Você me sequestraria?

— Ah, sim.

Ele ri.

— E me prenderia contra minha vontade?

Nossa, isso é sexy.

— Ah, sim. — Ele balança a cabeça. — E estamos falando de TTP 24/7.

— Não estou entendendo — sussurro, o coração aos pulos...

Ele está falando sério?

— Total Troca de Poder, dia e noite.

Os olhos dele brilham, e sua excitação é palpável mesmo de onde estou.

Puta merda.

Portanto, você não tem escolha — diz ele com sarcasmo.

— É claro. — Não consigo disfarçar o tom de ironia ao olhar para cima.

— Ah, Anastasia Steele, será que você acabou de revirar os olhos para mim?

Merda.

— Não — guincho.

— Acho que revirou. O que eu disse que faria com você se tornasse a revirar os olhos para mim?

Merda. Ele se senta na beira da cama.

— Vem cá — diz com a voz macia.

Fico lívida. Putz... ele fala sério. Sento-me olhando para ele, totalmente imóvel.

— Ainda não assinei — sussurro.

— Eu disse o que faria. Sou um homem de palavra. Vou lhe dar uma surra, e então vou foder você bem depressa e com bastante força. Parece que vamos precisar daquela camisinha, afinal.

A voz dele é muito macia, ameaçadora, e isso é excitante para cacete. Minhas entranhas praticamente se contorcem com um desejo forte, irreprimível, líquido. Ele me olha, aguardando, olhos inflamados. Timidamente, estico as pernas. Será que eu devia fugir? É isso aí. Nosso relacionamento está em suspenso, aqui, agora. Será que o deixo fazer isso ou digo não e acabou a história? Porque sei que tudo estará terminado se eu disser não. Faça isso!, minha deusa interior me implora. Meu inconsciente está tão paralisado quanto eu.

— Estou esperando — diz ele. — Não sou um homem paciente.

Ah, por tudo o que é mais sagrado. Estou ofegando, apavorada, excitada. Meu corpo todo lateja e estou com as pernas bambas. Lentamente, vou me arrastando até ficar ao lado dele.

— Muito bem — murmura ele. — Agora, levante-se.

Ah, merda... será que ele não pode acabar logo com isso? Não sei se aguento. Timidamente, fico em pé. Ele estende a mão, e coloco a camisinha em sua palma. De repente, ele me agarra, me fazendo cair por cima dele. Com um único movimento suave, posiciona-se de tal maneira que fico com o torso deitado na cama a seu lado. Ele joga a perna direita por cima das minhas e me prende com o braço, imobilizando-me. Ai, porra.

— Coloque as mãos na cabeça — ordena.

Obedeço na mesma hora.

— Por que estou fazendo isso, Anastasia? — pergunta.

— Porque revirei os olhos para você. — Mal consigo falar.

— Acha que essa é uma atitude educada?

— Não.

— Vai fazer de novo?

— Não.

— Vou lhe dar uma surra toda vez que fizer isso, entendeu?

Muito lentamente, ele abaixa minhas calças. Ai, como isso é degradante! Degradante, assustador e excitante. Ele está fazendo disso um bicho de sete cabeças. Estou com o coração na boca. Mal consigo respirar. Merda, será que vai doer?

Ele põe a mão na minha bunda nua, acariciando-me delicadamente, fazendo movimentos circulares com a palma da mão. De repente, retira a mão... e me bate — com força. Ai! Arregalo os olhos reagindo à dor, e tento me levantar, mas ele põe a mão entre as minhas escápulas, forçando-me para baixo. Torna a acariciar o local onde me bateu, e sua respiração muda — está mais ruidosa, mais forte. Ele me bate de novo e de novo, depressa e sem interrupção. Puta merda, isso dói. Não emito um som, o rosto contraído para aguentar a dor. Tento me contorcer para me esquivar das palmadas — estimulada pela descarga de adrenalina que me percorre o corpo.

— Fique quieta — grunhe ele —, senão não vou parar de bater.

Ele agora está me esfregando, e a palmada vem logo em seguida. Surge um padrão rítmico: carinho, afago, palmada. Tenho que me concentrar para enfrentar essa dor. Minha cabeça se esvazia enquanto me esforço para absorver aquela agonia. Ele não me bate duas vezes no mesmo lugar sucessivamente — está espalhando a dor.

— Aaai! — grito na décima palmada, e percebo que andei contando mentalmente os golpes.

— Só estou me aquecendo.

Ele me bate de novo, depois me afaga. A combinação da dor da palmada forte com o carinho é muito cansativa. Ele me bate de novo... isso está ficando mais difícil de aguentar. Meu rosto dói de tanta tensão. Ele me afaga com delicadeza e depois volta a bater. Grito de novo.

— Ninguém vai ouvir você, baby, só eu.

E me bate de novo e de novo. Do fundo da minha alma, quero implorar para que ele pare. Mas não faço isso. Não quero lhe dar esse prazer. Ele continua naquele ritmo sem trégua. Grito mais seis vezes. Dezoito tapas ao todo. Meu corpo está urrando, urrando por causa desse ataque impiedoso.

— Chega — sussurra ele asperamente. — Muito bem, Anastasia. Agora vou foder você.

Ele afaga com delicadeza minha bunda, que arde ao ser acariciada em movimentos circulares e descendentes. De repente, ele enfia dois dedos dentro de mim, pegando-me completamente desprevenida. Arquejo, este novo ataque quebrando o torpor que envolvia meu cérebro.

— Está sentindo? Está vendo quanto seu corpo gosta disso, Anastasia? Você está toda molhada só para mim.

Há um tom de assombro em sua voz. Ele mexe os dedos rapidamente num movimento de vaivém.

Gemo. Não, claro que não. E aí os dedos saem... e fico querendo que voltem.

— Da próxima vez farei você contar. Onde está aquela camisinha?

Ele pega a camisinha e me levanta delicadamente, colocando-me de bruços na cama. Escuto o zíper dele e o invólucro sendo aberto. Ele tira minha calça completamente e me põe ajoelhada, acariciando de leve minha bunda, agora muito dolorida.

— Vou comer você agora. Pode gozar — murmura ele.

O quê? Como se eu tivesse escolha.

E ele está dentro de mim, rapidamente me preenchendo. Solto um gemido forte. Ele mexe, me penetrando com força, um ritmo rápido e ardente na minha bunda dolorida. A sensação é bastante intensa, dura, degradante e alucinante. Meus sentidos estão devastados, desligados, concentrados apenas no que ele está fazendo comigo. Agora ele me faz sentir aquela tensão familiar apertando lá dentro, cada vez mais rápido. NÃO... e meu corpo traiçoeiro explode num orgasmo intenso e violento.

— Ah, Ana! — grita ele ao gozar, segurando-me ali ao se derramar em mim. Ele desaba, arfando ruidosamente ao meu lado, e me puxa para cima dele, enterrando o rosto nos meus cabelos, o corpo colado ao meu.

— Ah, baby — sussurra. — Bem-vinda ao meu mundo.

Ficamos ali deitados, os dois ofegantes, querendo que nossa respiração se estabilize. Ele afaga meu cabelo. Estou de novo em cima de seu peito. Mas dessa vez, não tenho forças para levantar a mão e tocar nele. Nossa... sobrevivi. Não foi tão ruim assim. Sou mais forte do que pensava. Minha deusa interior está prostrada... bem, pelo menos está calada. Christian torna a esfregar o nariz no meu cabelo, inspirando profundamente.

— Muito bem, baby — diz, num tom exultante.

Suas palavras me aconchegam como uma toalha macia e felpuda do Hotel Heathman, e estou muito feliz por ele estar satisfeito.

Ele puxa a alça da minha camiseta.

— É com isso que você dorme? — pergunta com delicadeza.

— É — sussurro sonolenta.

— Você devia estar vestida de seda e cetim, menina linda. Vou levá-la para fazer compras.

— Gosto do meu moletom — murmuro, tentando em vão soar irritada.

Ele me dá outro beijo na cabeça.

— Vamos ver — diz.

Ficamos ali deitados mais uns minutos, umas horas, quem sabe, e acho que cochilo.

— Tenho que ir — diz ele, e me dá um beijo na testa. — Você está bem?

Seu tom é meigo.

Penso na pergunta dele. Minha bunda está doendo. Bem, agora está ardendo, e, por incrível que pareça, apesar de exausta, estou radiante. A consciência disso é humilhante, inesperada. Não entendo.

— Estou bem — digo, baixinho. Não quero dizer mais que isso.

Ele se levanta.

— Onde é o banheiro?

— No fim do corredor à esquerda.

Ele pega a outra camisinha e sai do quarto. Levanto-me toda dura e visto a calça. Ela machuca um pouco minha bunda ainda ardida. Estou muito confusa com minha reação. Lembro que ele disse, não me lembro de quando — que eu iria me sentir muito melhor depois de uma boa surra. Como pode? Eu realmente não entendo. Mas, por estranho que pareça, é como eu me sinto. Não posso dizer que tenha gostado da experiência. Na verdade, eu ainda faria tudo para evitá-la, mas agora... tenho essa sensação estranha de segurança e saciedade que ficou do prazer. Ponho as mãos na cabeça. Simplesmente não entendo.

Christian volta para o quarto. Não consigo fitá-lo nos olhos. Olho para minhas mãos.

— Encontrei um óleo de bebê. Deixe eu passar um pouco em você.

O quê?

— Não. Vou ficar bem.

— Anastasia — avisa ele, e quero revirar os olhos, mas logo me detenho.

Fico em pé de frente para a cama. Ele senta ao meu lado e, com delicadeza, torna a abaixar minha calça. Arriando e levantando feito roupa de puta, comenta meu inconsciente com amargura. Mentalmente eu o mando para aquele lugar. Christian põe óleo na mão e me massageia de maneira terna e cuidadosa — de removedor de maquiagem a bálsamo calmante para uma bunda espancada, quem diria que aquele líquido era tão versátil.

— Gosto das minhas mãos em você — murmura ele, e tenho que concordar: eu também.

— Pronto — diz quando termina, e levanta minha calça de novo.

Olho o relógio. São dez e meia.

— Já vou indo.

— Acompanho você até a porta.

Ainda não consigo olhar para ele.

Ele pega minha mão e me conduz até a porta. Felizmente, Kate não está em casa. Ela deve estar jantando com os pais e Ethan. Ainda bem que não estava por perto para ouvir minha punição.

— Não tem que ligar para o Taylor? — pergunto, evitando contato visual.

— Taylor está aqui desde as nove. Olhe para mim — pede.

Esforço-me para fitá-lo nos olhos, mas, quando faço isso, ele está me olhando espantado.

— Você não chorou — murmura, e de repente me agarra e me beija apaixonadamente. — Domingo — diz, a boca colada na minha, e isso é uma promessa e uma ameaça.

Fico olhando-o descer os degraus e embarcar naquele Audi preto enorme. Não olha para trás. Fecho a porta e paro na sala de um apartamento onde só passarei mais duas noites, impotente. Uma casa onde vivi feliz por quase quatro anos... mas hoje, pela primeira vez na vida, me sinto só e desconfortável aqui, infeliz comigo mesma. Será que me afastei tanto assim de quem eu sou? Sei que ali à espreita, não muito longe do meu exterior bastante entorpecido, há um poço de lágrimas. O que estou fazendo? A ironia é que nem posso me sentar para chorar à vontade. Tenho que ficar em pé. Sei que é tarde, mas resolvo ligar para minha mãe.

— Querida, como você está? Como foi a formatura? — pergunta ela com entusiasmo do outro lado da linha.

Sua voz é um bálsamo calmante.

— Desculpe a hora — sussurro.

Ela faz uma pausa.

— Ana, o que houve? — Está toda séria agora.

— Nada, mãe, eu só queria ouvir sua voz.

Ela fica um instante calada.

— Ana, o que houve? Fale comigo, por favor.

Sua voz é meiga e reconfortante, e sei que ela está interessada. Espontaneamente, minhas lágrimas começam a escorrer. Já chorei muito nesses últimos dias.

— Por favor, Ana — diz ela, e sua angústia espelha a minha.

— Ah, mãe, é um homem.

— O que ele fez com você?

A preocupação dela é palpável.

— Não é isso.

Embora seja... Ah, merda. Não quero preocupá-la. Só quero que outra pessoa seja forte por mim agora.

— Ana, por favor, você está me preocupando.

Respiro fundo.

— Eu meio que me apaixonei por esse cara, e ele é muito diferente de mim, e não sei se devemos ficar juntos.

— Ah, querida, eu queria poder estar com você. Estou morrendo de pena de ter perdido sua formatura. Você se apaixonou por alguém, finalmente. Ah, querida, homens são muito difíceis. Pertencem a uma espécie diferente. Há quanto tempo você o conhece?

Christian definitivamente pertence a uma espécie diferente... um planeta diferente.

Ah, há umas três semanas mais ou menos.

— Ana, querida, isso é praticamente nada. Como você pode conhecer alguém em tão pouco tempo? Pegue leve com ele e mantenha certa distância até decidir se ele é digno de você.

Nossa... me enerva quando minha mãe enxerga tanto as coisas, mas ela está muito atrasada nisso. Será que ele é digno de mim? Esse é um conceito interessante. Eu sempre me perguntei se eu era digna dele.

— Querida, sua voz está muito triste. Venha para casa visitar a gente. Sinto sua falta. Bob também ia adorar vê-la. Você pode se distanciar um pouco e talvez enxergar as coisas melhor. Você precisa de um tempo. Anda trabalhando muito.

Puxa vida, isso é tentador. Fugir para a Geórgia, pegar sol, tomar uns drinques. Aproveitar o bom humor da minha mãe... seus braços amorosos.

— Tenho duas entrevistas de estágio em Seattle na segunda-feira.

— Ah, que notícia boa!

A porta se abre, e Kate aparece, sorrindo para mim. Sua expressão muda quando vê que andei chorando.

— Mãe, tenho que desligar. Vou pensar em dar um pulo aí. Obrigada.

— Querida, por favor, não deixe um homem virar uma obsessão para você. Você é muito jovem. Aproveite a vida.

— Sim, mãe, te amo.

— Ah, Ana, eu também amo muito você. Não se arrisque, querida.

Desligo e encaro Kate, que me olha furiosa.

— Aquele fodedor podre de rico tornou a perturbar você?

— Não... mais ou menos... hã... sim.

— Manda ele ir passear, Ana. Você anda muito instável desde que o conheceu. Nunca vi você assim.

O mundo de Katherine Kavanagh é muito claro, todo preto e branco. Sem os vagos, intangíveis e misteriosos tons de cinza que colorem meu mundo. Bem-vinda ao meu mundo.

Sente-se, vamos conversar. Vamos tomar um vinho. Ah, você bebeu champanhe. — Ela olha a garrafa. — E do bom.

Meu sorriso não convence, e olho com apreensão para o sofá. Aproximo-me dele com cautela. Hum... sentar.

— Você está bem?

— Eu caí sentada no chão.

Ela não pensa em questionar minha explicação, porque sou uma das pessoas mais desastradas do estado de Washington. Nunca pensei que iria enxergar isso como uma bênção. Sento cheia de dedos, e tenho a surpresa agradável de ver que estou bem. Volto a atenção para Kate, mas meus pensamentos retrocedem até o Heathman — Bem, se fosse minha, você ia passar uma semana sem conseguir se sentar depois do que aprontou ontem. Ele disse isso e, na hora, eu não conseguia me concentrar em mais nada senão em ser dele. Todos os sinais de alerta estavam ali, eu só fui muito burra e estava muito apaixonada para não ver.

Kate volta para a sala com uma garrafa de vinho tinto e xícaras lavadas.

— Pronto.

Ela me dá uma xícara de vinho. Não vai ser tão gostoso quanto aquele champanhe.

— Ana, se ele é um babaca e tem medo de compromisso, largue ele. Embora eu realmente não entenda esse problema de compromisso. Ele não conseguia tirar os olhos de você na tenda, ficava vigiando feito um falcão. Eu diria que está perdidamente apaixonado, mas talvez ele tenha um jeito diferente de demonstrar isso.

Perdidamente apaixonado? Christian? Jeito diferente de demonstrar? Eu que o diga.

— Kate, é complicado. Como foi sua noite? — pergunto.

Não posso discutir isso com Kate sem revelar demais, mas pergunto sobre o dia dela, e ela embarca. É tranquilizador ficar sentada ouvindo uma conversa normal. A grande novidade é que Ethan pode vir morar com a gente depois das férias deles. Vai ser divertido. Ethan é engraçadíssimo. Franzo a testa. Acho que Christian não vai aprovar. Bem... azar o dele. Vai ter que engolir. Bebo umas xícaras de vinho e decido encerrar o expediente. Foi um dia muito longo. Kate me dá um abraço, e pega o telefone para ligar para Elliot.

Olho a máquina do mal depois de escovar os dentes. Tem um e-mail de Christian.

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De: Christian Grey

Assunto: Você

Data: 26 de maio de 2011 23:14

Para: Anastasia Steele


Cara Srta. Steele,


Você é simplesmente perfeita. A mulher mais linda, inteligente, espirituosa e corajosa que já conheci. Tome um Advil — isso não é uma exigência. E não dirija mais seu fusca. Eu ficarei sabendo.


Christian Grey


CEO, Grey Enterprises Holdings, Inc.


Ah, não dirigir mais meu carro! Digito uma resposta.

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De: Anastasia Steele

Assunto: Lisonjas

Data: 26 de maio de 2011 23:20

Para: Christian Grey


Caro Sr. Grey,

Lisonjas não vão levá-lo a lugar algum, mas já que o senhor está em toda parte, não adianta discutir.


Precisarei levar meu fusca a uma oficina para vendê-lo — portanto não aceitarei seus disparates sobre esse assunto.


Vinho tinto é sempre preferível a Advil.


Ana


P.S.: Surra de vara é um limite rígido para mim.


Teclo em “enviar”.

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De: Christian Grey

Assunto: Mulheres frustrantes que não conseguem aceitar elogios

Data: 26 de maio de 2011 23:26

Para: Anastasia Steele


Cara Srta. Steele,

Não a estou lisonjeando. Você devia ir se deitar.


Aceito seu acréscimo aos limites rígidos.


Não beba demais.


Taylor venderá seu carro e conseguirá um bom preço por ele, também.


Christian Grey


CEO, Grey Enterprises Holdings, Inc.

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De: Anastasia Steele

Assunto: Taylor — Ele é o homem certo para a função?

Data: 26 de maio de 2011 23:40

Para: Christian Grey


Prezado Senhor,

Estou intrigada com o fato de que esteja disposto a correr o risco de deixar seu braço direito, mas não a mulher com quem você fode de vez em quando, dirigir meu carro. Como posso ter certeza de que Taylor é o homem que vai conseguir o melhor preço pelo referido carro? No passado, provavelmente antes de conhecê-lo, eu era famosa por conseguir me dar bem nos negócios.


Ana

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De: Christian Grey

Assunto: Cuidado!

Data: 26 de maio de 2011 23:44

Para: Anastasia Steele


Cara Srta. Steele,

Estou presumindo que esta conversa seja efeito do vinho tinto, e que tenha tido um dia muito longo.


Mas estou tentado a voltar aí para garantir que passe a semana sem conseguir se sentar.


Taylor é ex-militar e sabe dirigir qualquer veículo, desde uma motocicleta até um tanque Sherman. Seu carro não oferece risco para ele.


Agora, por favor, não se refira à sua pessoa como “uma mulher com quem eu fodo de vez em quando”, porque, com muita franqueza, isso me deixa louco, e você realmente não iria gostar de mim quando estou zangado.


Christian Grey


CEO, Grey Enterprises Holdings, Inc.

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De: Anastasia Steele

Assunto: Cuidado você

Data: 26 de maio de 2011 23:57

Para: Christian Grey


Prezado Sr. Grey,

Não sei ao certo se gosto do senhor, sobretudo no presente momento.


Srta. Steele

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De: Christian Grey

Assunto: Cuidado você

Data: 27 de maio de 2011 00:03

Para: Anastasia Steele


Por que não gosta de mim?


Christian Grey


CEO, Grey Enterprises Holdings, Inc.

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De: Anastasia Steele

Assunto: Cuidado você

Data: 27 de maio de 2011 00:09

Para: Christian Grey


Porque o senhor nunca fica comigo.


Pronto, isso lhe dá algo em que pensar. Desligo a máquina com um floreio que realmente não combina e vou para a cama. Apago a luz e fico olhando para o teto. Foi um dia longo, uma emoção atrás da outra. Foi gostoso passar umas horas com Ray. Ele estava com boa aparência, e, por incrível que pareça, aprovou Christian. Putz, Kate e aquela sua língua de trapo. Ouvir Christian mencionar que passou fome. Que diabo é isso? Nossa, e o carro. Nem contei a Kate sobre o carro. O que Christian estava pensando?

E depois, hoje à noite, ele me bateu mesmo. Nunca ninguém me bateu na vida. Onde é que fui me meter? Muito devagarinho, as lágrimas interrompidas pela chegada de Kate começam a escorrer pelo meu rosto e a entrar pelos ouvidos. Apaixonei-me por alguém tão fechado emocionalmente que só vou me machucar — no fundo, eu sei disso —, alguém que se confessa completamente fodido. Por que ele é tão fodido? Deve ser horrível ser tão marcado como ele é, e a ideia de que tenha sofrido alguma crueldade insuportável na primeira infância me faz chorar mais. Quem sabe, se ele fosse mais normal, ele não quisesse você, meu inconsciente contribui maliciosamente para minhas elucubrações... e, no fundo, sei que isso é verdade. Ponho o rosto no travesseiro, e a comporta se abre... e, pela primeira vez em muitos anos, estou soluçando incontrolavelmente.

Sou momentaneamente distraída do meu sofrimento pelos gritos de Kate.

— O que você acha que está fazendo aqui, porra?

— Bem, você não pode!

— O que você fez com ela agora, porra?

— Desde que conheceu você, ela vive chorando.

— Você não pode entrar aqui!

Christian invade meu quarto e, sem cerimônia, acende a luz, me fazendo apertar os olhos.

— Nossa, Ana — murmura.

Torna a apagar a luz, e logo está a meu lado.

— O que você está fazendo aqui? — digo entre soluços.

Merda. Não consigo parar de chorar.

Ele acende a luz da cabeceira, me fazendo apertar os olhos de novo. Kate chega e fica parada à porta.

— Quer que eu ponha esse babaca para fora? — pergunta ela, irradiando uma hostilidade termonuclear.

Christian ergue as sobrancelhas para ela, sem dúvida surpreso com aquele epíteto lisonjeiro e aquele antagonismo feroz. Faço que não com a cabeça, e ela revira os olhos para mim. Ah... eu não faria isso perto do Sr. G.

— Se precisar de mim, é só gritar — diz ela com mais delicadeza. — Grey, você está na minha lista negra e estou de olho em você — sibila ela.

Ele pisca para ela, que dá meia-volta e deixa a porta encostada. Christian me olha com uma expressão séria, o rosto pálido. Está com aquele blazer de risca de giz, de cujo bolso interno saca um lenço para me dar. Acho que ainda tenho aquele seu outro blazer em algum canto.

— O que está acontecendo? — pergunta ele baixinho.

— Por que você está aqui? — pergunto, sem responder-lhe.

Parei de chorar como que por milagre, mas ainda sou sacudida por soluços.

— Parte do meu papel é cuidar das suas necessidades. Você disse que queria que eu ficasse, portanto, estou aqui. E, no entanto, encontro você neste estado. — Ele pisca para mim, realmente perplexo. — Tenho certeza de que sou responsável por isso, mas não faço ideia do motivo. Foi por que bati em você?

Levanto-me da cama, contraindo o rosto por causa da dor. Sento-me e o encaro.

— Você tomou o Advil?

Balanço a cabeça. Ele aperta os olhos, se levanta e sai do quarto. Ouço-o falando com Kate, mas não dá para escutar a conversa. Volta pouco depois com uns comprimidos e uma xícara de água.

— Tome esses comprimidos — ordena com delicadeza ao sentar-se na cama ao meu lado.

Obedeço.

— Fale comigo — murmura. — Você me disse que estava bem. Eu nunca teria ido embora se achasse que você estivesse desse jeito.

Fico olhando para baixo. O que posso dizer que ainda não tenha dito? Quero mais. Quero que ele fique porque ele quer ficar comigo, não porque eu esteja aos prantos, e não quero que ele bata em mim, será que isso é muito absurdo?

— Suponho que, quando disse que estava bem, você não estava.

Enrubesço.

— Achei que estivesse.

— Anastasia, você não pode me dizer o que acha que eu quero ouvir. Isso não é muito honesto — censura. — Como posso acreditar em qualquer coisa que você já me disse?

Olho para ele, e Christian está franzindo as sobrancelhas, com uma expressão triste. Passa as mãos no cabelo.

— Como você se sentiu enquanto eu batia em você e depois de eu ter batido?

— Não gostei. Eu preferiria que você não fizesse isso de novo.

— Você não deveria gostar.

— Por que você gosta disso?

Olho para ele. Minha pergunta o surpreende.

— Quer mesmo saber?

— Ah, pode acreditar, estou muito interessada.

E não consigo disfarçar o tom sarcástico.

Ele aperta os olhos de novo.

— Cuidado — avisa.

Fico lívida.

— Vai me bater de novo?

— Não, hoje não.

Ufa... meu inconsciente e eu damos um suspiro de alívio.

— Então? — provoco.

— Gosto do controle que isso me dá, Anastasia. Quero que você se comporte de um determinado jeito, e se você não se comportar, punirei você, e então aprenderá a se comportar do jeito que eu quero. Gosto de castigar. Quis dar uma surra em você desde que me perguntou se eu era gay.

Coro ao me lembrar disso. Putz, eu queria me espancar depois de ter feito essa pergunta. Então Katherine Kavanagh é a responsável por tudo isso, e se tivesse ido naquela entrevista e perguntado se ele era gay, ela estaria sentada aqui com a bunda doendo. Não gosto desse pensamento. Como tudo isso é confuso!

— Então você não gosta do jeito como eu sou.

Ele me olha, de novo perplexo.

— Acho você encantadora do jeito que é.

— Então por que está tentando me mudar?

— Não quero mudar você. Eu gostaria que você fosse gentil e seguisse as regras que lhe dei e não me desafiasse. Simples assim — diz ele.

— Mas você quer me castigar?

— Quero.

— É isso que eu não entendo.

Ele suspira e torna a passar a mão no cabelo.

— Eu sou assim, Anastasia. Preciso estar no controle. Preciso que você se comporte de determinada maneira, e, se você não fizer isso, adoro ver sua linda pele de alabastro ficar cor-de-rosa debaixo das minhas mãos. Isso me excita.

Puta que pariu. Agora sim estamos chegando em algum lugar.

— Então não é a dor que você me faz passar?

Ele engole em seco.

— Um pouco, para ver o que você aguenta, mas não é só isso. É também pelo fato de você ser minha para eu fazer o que achar conveniente. Controle máximo sobre outra pessoa. E isso me excita. Muito, Anastasia. Olha, não estou me explicando muito bem... Nunca tive que me explicar antes. Ainda não pensei nisso muito a fundo. Sempre estive com pessoas com a mesma mentalidade. — Ele encolhe os ombros, se desculpando. — E você ainda não respondeu à minha pergunta: como se sentiu depois?

— Confusa.

— Você ficou sexualmente muito excitada com isso, Anastasia.

Ele fecha os olhos rapidamente, e, ao tornar a abri-los e olhar para mim, eles estão em chamas.

Sua expressão afeta aquela parte obscura de mim, escondida nas minhas entranhas — minha libido, despertada e domada por ele mas, mesmo agora, insaciável.

— Não me olhe assim — murmura ele.

Franzo a testa. Putz, o que eu fiz agora?

— Não tenho camisinha, Anastasia, e você está transtornada. Ao contrário do que sua amiga pensa, não sou um monstro. Então, você ficou confusa?

Contorço-me sob aquele seu olhar intenso.

— Você não tem problema em ser sincera comigo por escrito. Seus e-mails sempre me dizem exatamente como se sente. Por que não pode fazer isso quando conversamos pessoalmente? Será que eu a intimido tanto assim?

Puxo um ponto imaginário da colcha azul e creme da minha mãe.

— Você me engana, Christian. Me perturba completamente. Sinto-me como Ícaro se aproximando muito do sol — sussurro.

Ele arqueja.

— Bem, acho que é o contrário — murmura.

— O quê?

— Ah, Anastasia, você me enfeitiçou. Não é óbvio?

Não, não para mim. Enfeitiçou... minha deusa interior está olhando boquiaberta. Nem ela acredita nisso.

— Você ainda não respondeu à minha pergunta. Me escreva um e-mail, por favor. Mas, no momento, eu realmente gostaria de dormir. Posso ficar aqui?

— Quer ficar?

Não consigo disfarçar o tom esperançoso da minha voz.

— Você me quis aqui.

— Você não respondeu à minha pergunta.

— Vou escrever um e-mail — retruca ele com petulância.

Ele se levanta, tira o BlackBerry, as chaves, a carteira e o dinheiro dos bolsos da calça. Puta merda, o homem carrega uma bagulhada danada nos bolsos. Ele tira também o relógio, os sapatos, as meias e a calça, e pendura o blazer na minha cadeira. Vai para o outro lado da cama e se deita.

— Deite-se — ordena.

Deslizo lentamente para debaixo das cobertas, contraindo o rosto, olhando para ele. Minha nossa... ele ficou. Acho que estou entorpecida com o choque eufórico. Ele se apoia no cotovelo, e olha para mim.

— Se vai chorar, chore na minha frente. Preciso saber.

— Quer que eu chore?

— Não especialmente. Só quero saber como você se sente. Não a quero escorregando por entre meus dedos. Apague a luz. Já é tarde, e nós dois temos que trabalhar amanhã.

Está aqui... e continua autoritário, mas não posso me queixar. Ele está na minha cama. Não entendo bem por que... talvez eu deva chorar com mais frequência na frente dele. Apago a luz da cabeceira.

— Deite-se de lado, de costas para mim — murmura ele no escuro.

Reviro os olhos sabendo perfeitamente que ele não pode me ver, mas obedeço. Sem jeito, ele se aproxima, passa o braço em volta de mim e me puxa para junto de si.

— Durma, baby — ordena, e sinto seu nariz nos meus cabelos enquanto ele inspira profundamente.

Puta merda. Christian Grey está dormindo comigo e, aninhada em seus braços, caio num sono tranquilo.

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