CAPÍTULO VINTE E QUATRO

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Christian está em pé numa jaula de barras de aço, com aquela calça jeans rasgada e macia, de peito nu e pés descalços, o que me dá água na boca, e está olhando para mim. Tem aquele sorriso insolente estampado em seu lindo rosto e seus olhos de um cinza líquido. Segura uma tigela de morangos nas mãos. Aproxima-se com elegância atlética até a frente da jaula, olhando-me atentamente. Segurando um morango carnudo e maduro, ele estende a mão através da grade.

— Coma — diz voluptuosamente.

Tento andar em direção a ele, mas estou amarrada, presa pelo pulso por uma força invisível que me segura. Deixe eu ir.

— Venha, coma — diz ele, com aquele delicioso sorriso torcido.

Puxo, puxo... deixe eu ir! Quero gritar e berrar, mas não sai som nenhum. Estou muda. Ele se estica mais um pouco, e o morango está encostado nos meus lábios.

— Coma, Anastasia. — Sua boca forma meu nome, demorando sensualmente em cada sílaba.

Abro a boca e mordo, a jaula desaparece e minhas mãos estão livres. Estico o braço para tocar nele, passo os dedos nos pelos de seu peito.

— Anastasia.

Não, gemo.

Vamos lá, baby.

Não. Quero tocar em você.

— Acorde.

Não. Por favor. Abro os olhos a contragosto por uma fração de segundo. Estou na cama e alguém está esfregando o nariz na minha orelha.

— Acorde — sussurra ele, e o efeito de sua voz doce se espalha feito caramelo quente por minhas veias.

É Christian. Ainda está escuro, e as imagens dele em meu sonho persistem, desconcertantes e tentadoras em minha cabeça.

— Ah... não — gemo.

Quero voltar para seu peito, voltar para o sonho. Por que ele está me acordando? É noite alta, ou assim parece. Puta merda. Será que ele quer sexo — agora?

— Hora de levantar, baby. Vou acender a luz.

Ele fala baixo.

— Não — gemo.

— Quero acordar com você — diz ele, beijando meu rosto, as pálpebras, a ponta do nariz, a boca, e abro os olhos. A luz está acesa. — Bom dia, bela adormecida — murmura ele.

Gemo, e ele sorri.

— Você não é uma pessoa matinal — sussurra.

Ofuscada pela claridade, aperto os olhos e vejo Christian debruçado sobre mim, sorrindo. Achando graça. Achando graça em mim. Vestido! De preto.

— Pensei que você quisesse sexo — resmungo.

— Anastasia, sempre quero sexo com você. É reconfortante saber que você sente a mesma coisa — diz ele secamente.

Olho para ele enquanto os meus olhos se adaptam à claridade, mas ele ainda está com a expressão alegre... graças a Deus.

— Claro que quero, só não quando é tão tarde.

— Não é tarde, é cedo. Vamos, levante. Vamos sair. Vou aceitar um vale para o sexo.

— Eu estava tendo um sonho muito bom — choramingo.

— Sonhava com o quê? — pergunta com paciência.

— Com você — digo, corando.

— O que eu estava fazendo dessa vez?

— Tentando me dar morangos para comer.

Ele esboça um sorriso.

— O Dr. Flynn adoraria saber disso. Levante, vista-se. Não precisa tomar banho, podemos fazer isso depois.

Nós!

Sento-me na cama, e o lençol desce para minha cintura, revelando meu corpo. Ele se levanta para me dar espaço, os olhos sombrios.

— Que horas são?

— Cinco e meia da manhã.

— Parece três da madrugada.

— Não temos muito tempo. Deixei você dormir o máximo possível. Venha.

— Não posso tomar uma chuveirada?

Ele suspira.

— Se você tomar, vou querer tomar com você, e você e eu sabemos o que vai acontecer. Vamos perder a hora. Venha.

Ele está animado, irradiando expectativa e entusiasmo, como um garotinho. Isso me faz sorrir.

— O que vamos fazer?

— É surpresa. Eu avisei.

Não posso deixar de rir para ele.

— Tudo bem.

Levanto da cama e procuro minhas roupas. Claro que elas estão bem dobradinhas ao lado da cama. Ele estendeu também uma das suas cuecas de malha — Ralph Lauren, nada menos. Visto-a, e ele sorri para mim. Humm, mais uma cueca de Christian Grey — um troféu para acrescentar à minha coleção, ao lado do carro, do BlackBerry e do Mac, do seu blazer preto e de valiosos livros em primeira edição. Balanço a cabeça diante da generosidade dele, e franzo a testa quando uma cena de Tess me passa pela cabeça: a cena do morango. Ela evoca meu sonho. Para o diabo com o Dr. Flynn — Freud adoraria saber disso — e então provavelmente morreria tentando lidar com Christian.

— Vou deixá-la à vontade agora que você se levantou.

Ele sai do quarto, e vou para o banheiro. Tenho necessidades a satisfazer, e quero me lavar rapidamente. Sete minutos depois, estou na área de estar, limpa, penteada, de calça jeans, blusa e com a cueca de Christian Grey. Ele dá uma olhada da mesinha de jantar onde está tomando o café da manhã. Café da manhã! Putz, a essa hora.

— Coma — diz ele.

Puta que pariu... meu sonho. Olho para ele boquiaberta, pensando no jeito que ele disse coma. Humm, jeito de quem sabe comer.

— Anastasia — diz ele severo, tirando-me do meu devaneio.

Realmente é muito cedo para mim. Como lidar com isso?

— Vou tomar um chá. Posso comer um croissant mais tarde?

Ele me olha desconfiado, e sorrio com muita doçura para ele.

— Não estrague minha festa, Anastasia — avisa ele com a voz suave.

— Vou comer mais tarde, quando meu estômago acordar. Lá pelas sete e meia... tudo bem?

— Tudo bem.

Ele me olha.

Sinceramente. Tenho que me concentrar muito para não fazer uma careta para ele.

— Quero revirar os olhos para você.

— Claro, faça isso, e vou ganhar o dia — diz ele severo.

Olho para o teto.

— Bem, uma surra me acordaria, eu acho.

Contraio os lábios, na expectativa.

Christian fica boquiaberto.

— Por outro lado, não quero deixar você nem esquentado nem preocupado. De quente, já basta o clima daqui. — Dou de ombros com displicência.

Christian fecha a boca e se esforça para fazer uma expressão contrariada, mas não consegue. Dá para perceber o bom humor escondido no fundo dos seus olhos.

— Você é implicante, como sempre, Srta. Steele. Tome seu chá.

Vejo o rótulo Twinings, e meu coração pula de alegria. Está vendo, ele se importa, sim, pronuncia meu inconsciente para mim. Sento-me e o encaro, absorvendo sua beleza. Será que algum dia vou me fartar desse homem?

* * *

QUANDO SAÍMOS DO quarto, Christian joga um casaco de moletom para mim.

— Vai precisar disso.

Olho para ele, intrigada.

— Pode confiar em mim.

Ele sorri, inclina-se e me beija rapidamente nos lábios, depois pega minha mão e saímos.

Na rua, no frio relativo do lusco-fusco do alvorecer, o manobrista entrega a Christian um jogo de chaves de um chamativo carro esporte conversível. Faço uma cara espantada para Christian, que me dá um sorriso.

— Sabe, às vezes é ótimo ser eu — diz ele com um sorriso conspiratório, mas petulante, que simplesmente não posso deixar de emular.

Ele é absolutamente adorável quando está alegre e descontraído. Abre a porta do carro para mim com uma mesura exagerada, e entro. Ele está de muito bom humor.

— Aonde vamos?

— Você vai ver.

Ele sorri ao colocar o carro em movimento, e pegamos a Savannah Parkway. Ele programa o GPS, depois pressiona um botão no volante, e uma música clássica preenche o carro.

— O que é isso? — pergunto quando o som doce de cem cordas de violino nos assalta.

— É de La Traviata. Uma ópera de Verdi.

Nossa... é lindo.

La Traviata? Já ouvi falar. Não lembro onde. O que significa?

Christian me olha e dá um sorriso.

— Bem, literalmente, “a mulher perdida”. É baseada no livro de Alexandre Dumas, A dama das camélias.

— Ah. Já li.

— Achei que talvez já tivesse lido.

— A cortesã condenada. — Remexo-me desconfortável no assento de couro macio. Será que ele está tentando me dizer algo? — Humm, é uma história deprimente — murmuro.

— Muito deprimente? Quer escolher alguma música? Estão no meu iPod.

Christian está de novo com aquele sorriso misterioso.

Não vejo o iPod dele em lugar nenhum. Ele toca na tela no console entre nós, e pasmem, tem uma lista de músicas.

— Pode escolher.

Ele sorri, e sei que isso é um desafio.

O iPod de Christian Grey, isso deve ser interessante. Rolo a tela e encontro a canção perfeita. Aperto “play”. Eu não o imaginaria sendo um fã de Britney. A batida techno club-mix nos assalta, e Christian abaixa o volume. Talvez seja muito cedo para isso: Britney no máximo da sua sensualidade.

Toxic”, hein?

Christian sorri.

— Não sei o que você quer dizer — faço-me de inocente.

Ele abaixa mais um pouco a música, e, no íntimo, estou me abraçando. Minha deusa interior está em pé no pódio esperando sua medalha de ouro. Ele abaixou a música. Vitória!

— Eu não botei essa música no meu iPod — diz afinal, e acelera, fazendo com que eu fique colada no banco enquanto o carro corre na autoestrada.

O quê? Ele sabe o que está fazendo, o filho da mãe. Quem botou? E tenho que escutar Britney cantando. Quem... quem?

A música termina e o iPod passa para Damien Rice cantando desolado. Quem? Quem? Olho pela janela, o estômago revirado. Quem?

— Foi a Leila — responde ele aos meus pensamentos. Como ele faz isso?

— Leila?

— Uma ex, que botou a música no meu iPod.

Fico perplexa, tendo como música de fundo as modulações de Damien. Uma ex... ex-submissa? Uma ex...

— Uma das quinze? — pergunto.

— Sim.

— O que aconteceu com ela?

— Terminamos.

— Por quê?

Ai, droga. É muito cedo para esse tipo de conversa. Mas ele está com uma expressão relaxada, até feliz e, ainda por cima, está falante.

— Ela queria mais.

Sua voz é grave, chegando a ser introspectiva, e ele deixa a frase no ar em suspenso entre nós, terminando-a de novo com aquela palavrinha poderosa.

— E você não? — pergunto antes que possa usar meu filtro do cérebro para a boca. Merda, será que eu quero saber?

Ele balança a cabeça.

— Eu nunca quis mais até conhecer você.

Arquejo, encantada. Não é isso que eu quero? Ele quer mais. Ele também quer! Minha deusa interior deu um salto mortal do pódio e agora está dando cambalhotas pelo estádio. Não sou só eu.

— O que aconteceu com as outras quatorze? — pergunto.

Putz, ele está falando — aproveite.

— Quer uma lista? Divorciadas, decapitadas, mortas?

— Você não é Henrique VIII.

— Tudo bem. Sem nenhuma ordem especial, só tive relações longas com quatro mulheres, à parte Elena.

— Elena?

— Mrs. Robinson para você.

Ele dá aquele seu sorriso indolente.

Elena! Puta merda. A maligna tem nome e, pelo jeito, deve ser estrangeira. A visão de uma vamp gloriosa de pele clara, cabelos negros e lábios vermelhos me vem à mente, e sei que ela é linda. Não devo ficar pensando nisso. Não devo ficar pensando nisso.

— O que aconteceu com as quatro? — pergunto para me distrair.

— Muito perguntadora, muito ansiosa por informações, Srta. Steele — censura ele em tom jovial.

— Acha mesmo, Sr. Quando Deve Ficar Menstruada?

— Anastasia, um homem precisa saber dessas coisas.

— Precisa?

— Eu preciso.

— Por quê?

— Porque não quero que você engravide.

— Nem eu! Bem, só daqui a alguns anos.

Christian pisca, espantado, depois relaxa visivelmente. Tudo bem. Christian não quer filhos. Agora ou nunca? Estou encantada com esse seu súbito e inédito ataque de sinceridade. Quem sabe é a hora? Algo na água da Geórgia? O ar da Geórgia? O que mais quero saber? Carpe diem.

— Então as outras quatro, o que houve? — pergunto.

— Uma conheceu outra pessoa. As outras três queriam mais. Eu não estava a fim de mais na época.

— E as outras? — pressiono.

Ele me olha rapidamente e se limita a balançar a cabeça.

— Simplesmente não deu certo.

Ih, um monte de informações para digerir. Olho no espelho lateral do carro, e vejo os tons suaves de azul e rosa se espraiando no céu atrás do carro. A aurora está nos seguindo.

— Para onde estamos indo? — pergunto, perplexa, olhando para a Interestadual 95. Estamos indo para o sul, é só o que sei.

— Um campo de aviação.

— Não estamos voltando para Seattle, estamos?

Arquejo alarmada. Não me despedi de minha mãe. Ela está nos esperando para jantar.

Ele ri.

— Não, Anastasia, vamos nos distrair com meu segundo passatempo favorito.

— Segundo?

Franzo as sobrancelhas para ele.

— É. Contei do meu favorito hoje de manhã.

Olho para seu perfil glorioso, intrigada, quebrando a cabeça.

— É me distrair com você, Srta. Steele. Isso está no topo da minha lista. Do jeito que for.

Ah.

— Bem, isso também ocupa um dos primeiros lugares na minha lista de prioridades divertidas e bizarras — murmuro, corando.

— Gostei de ouvir isso — diz ele secamente.

— Então, campo de aviação?

Ele sorri para mim.

— Planar.

O termo diz vagamente alguma coisa. Ele já mencionou isso.

— Vamos atrás da aurora, Anastasia.

Ele se vira e sorri para mim enquanto o GPS o manda entrar à direita no que parece um complexo industrial. Para em frente a um vasto prédio com um letreiro que diz ASSOCIAÇÃO DE PLANADORES DE BRUNSWICK.

Planar! Vamos andar de planador?

Ele desliga o carro.

— Você topa? — pergunta ele.

— Você vai voar?

— Vou.

— Sim, por favor. — Não hesito. Ele sorri e me dá um beijo.

— Outra primeira, Srta. Steele — diz ele ao saltar do carro.

Primeira vez? Que tipo de primeira vez? Voar de planador pela primeira vez... merda! Não — ele disse que já fez isso. Relaxo. Ele dá a volta e abre minha porta. O céu agora está opalescente, irisado com um brilho suave por trás das esporádicas nuvens. Já amanheceu.

Christian pega minha mão e dá a volta no prédio, levando-me para uma longa pista onde há vários aviões estacionados. Ao lado dos aviões, um homem de cabeça raspada e olhar selvagem aguarda com Taylor.

Taylor! Será que Christian vai a algum lugar sem esse homem? Sorrio para ele, e ele sorri para mim com simpatia.

— Sr. Grey, este é seu piloto rebocador, Sr. Mark Benson — diz Taylor.

Christian e Benson trocam cumprimentos e dão início a uma conversa que parece extremamente técnica sobre velocidade, direções dos ventos e coisas assim.

— Olá, Taylor — murmuro timidamente.

— Srta. Steele. — Ele faz um aceno de cabeça ao me cumprimentar, e eu faço cara feia. — Ana — corrige-se. — Ele anda infernal esses últimos dias. Ainda bem que você está aqui — diz em tom conspiratório.

Ah, isso é novidade. Por quê? Com certeza não por minha causa! Quinta-feira de revelações! Deve ser alguma coisa na água de Savannah que faz esses homens se descontraírem um pouco.

— Anastasia — chama Christian. — Venha.

Ele estende a mão.

— Até logo.

Sorrio para Taylor, e, com uma rápida continência para mim, ele volta para o estacionamento.

— Sr. Benson, esta é minha namorada, Anastasia Steele.

— Muito prazer — murmuro ao apertarmos as mãos.

Benson me lança um sorriso deslumbrante.

— O prazer é meu — diz ele, e vejo pelo sotaque que é inglês.

Pego a mão de Christian empolgada, sentindo o frio na barriga aumentar. Nossa... planar! Atravessamos o pátio com Mark Benson a caminho da pista. Ele e Christian mantêm uma conversa constante. Capto o teor. Estaremos num Blanik L-23, que aparentemente é melhor que o L-13, embora isso esteja aberto a discussão. Benson vai voar um Piper Pawnee. Ele já é piloto rebocador de faixas há uns cinco anos. Isso não significa nada para mim, mas vejo Christian tão animado, tão confortável, que dá prazer.

O avião é comprido, elegante e branco com listras laranja. Tem uma cabine pequena com dois assentos, um na frente do outro. Está preso por um longo cabo branco a um aviãozinho convencional monomotor. Benson abre a grande cúpula transparente que forma a cabine para que possamos entrar.

— Primeiro precisamos colocar seu paraquedas.

Paraquedas!

Eu faço isso — interrompe-o Christian e pega a mochila de Benson, que sorri solicitamente para ele.

— Vou buscar um lastro — diz Benson, e se dirige ao avião.

— Você gosta de me amarrar — observo secamente.

— Srta. Steele, você não tem ideia. Venha, coloque os tirantes.

Obedeço, apoiando o braço em seu ombro. Christian se retesa ligeiramente mas não se mexe. Quando estou com os pés dentro das alças, ele puxa o paraquedas para cima, e coloco os tirantes dos braços. Com habilidade, ele afivela a mochila e ajusta todos os tirantes.

— Bom, está bem assim — diz com suavidade, mas seus olhos estão brilhando. — Você tem o prendedor de cabelo de ontem?

Balanço a cabeça.

— Quer que eu prenda o cabelo?

— Quero.

Obedeço depressa.

— Vá entrando — ordena Christian.

Ele continua muito autoritário. Dirijo-me ao banco de trás.

— Não, na frente. O piloto fica atrás.

— Mas você não vai conseguir ver!

— Vou ver muito.

Ele sorri.

Acho que nunca o vi tão feliz — autoritário, mas feliz. Subo e me instalo no assento de couro. É surpreendentemente confortável. Christian vem, se debruça, suspende a mochila nos meus ombros, pega o cinto inferior entre minhas pernas e o passa pela fivela que está encostada na minha barriga. Aperta todos os tirantes.

— Hum, duas vezes em uma manhã, sou um homem de sorte — murmura ele, e me beija rapidamente. — Isso não vai demorar, vinte, trinta minutos no máximo. A essa hora da manhã, as termais não são lá essas coisas, mas é muito impressionante lá em cima. Espero que você não esteja nervosa.

— Empolgada. — Sorrio.

De onde vem esse sorriso ridículo? Na verdade, uma parte de mim está apavorada. Minha deusa interior está embaixo de uma manta atrás do sofá.

— Ótimo.

Ele sorri também, acariciando meu rosto, depois some de vista.

Ouço e sinto seus movimentos quando ele sobe no avião atrás de mim. Claro que ele me apertou tanto que não consigo me virar para vê-lo... típico! Estamos muito perto do chão. Na minha frente, há um painel de mostradores e alavancas e um bastão grande. Não mexo em nada.

Mark Benson aparece com um sorriso alegre para verificar meus tirantes e se inclina para conferir o chão da cabine. Acho que é o lastro.

— É, está seguro. É a primeira vez? — pergunta.

— É.

— Vai adorar.

— Obrigada, Sr. Benson.

— Pode me chamar de Mark. — Vira-se para Christian. — Tudo bem?

— Sim. Vamos.

Ainda bem que não comi nada. Estou bastante empolgada, e acho que não teria estômago para comida, empolgação e deixar o solo. Mais uma vez, estou me colocando nas mãos habilidosas desse belo homem. Mark fecha a cúpula da cabine, vai até o avião em frente e embarca.

A hélice única do Piper dá a partida, e meu estômago vem parar na garganta. Putz... estou fazendo isso mesmo. Mark taxia lentamente na pista, e, quando o cabo estica, avançamos subitamente. Partimos. Ouço a conversa no rádio atrás de mim. Acho que é Mark falando com a torre — mas não consigo entender o que dizem. Conforme o Piper vai ganhando velocidade, nós também ganhamos. A pista é muito esburacada, e, na nossa frente, o monomotor continua no solo. Putz, será que vamos decolar alguma hora? E, de repente, meu estômago desce vertiginosamente — estamos no ar.

— Lá vamos nós! — grita Christian atrás de mim. E estamos dentro de nossa bolha, só nós dois. Só ouço o barulho do vento passando e o zumbido distante do motor do Piper.

Vou agarrada com as duas mãos na poltrona, apertando tanto que os nós dos meus dedos ficam brancos. Rumamos para oeste, para o interior, nos afastando do nascente, ganhando altura, atravessando campos e bosques e casas e a Interestadual 95.

Puxa vida. Isso é incrível, só o céu acima da gente. A luz é extraordinária, com o tom difuso e quente, e me lembro de José divagando sobre a “hora mágica”, uma hora do dia que os fotógrafos adoram — é essa... justo depois do alvorecer, e estou nela, com Christian.

De repente, lembro-me da exposição de José. Hum. Preciso dizer a Christian. Pergunto-me por um instante como ele vai reagir. Mas não vou me preocupar com isso agora — estou curtindo o passeio. Meus ouvidos estalam à medida que ganhamos altura, e o solo fica cada vez mais longe. Isso é tão calmo. Entendo perfeitamente por que ele gosta de estar aqui em cima. Longe do seu BlackBerry e de todas as pressões do trabalho.

O rádio estala, e Mark menciona três mil pés. Putz, isso parece alto. Olho o solo, e já não consigo distinguir mais nada com clareza lá embaixo.

— Largue — diz Christian no rádio, e, de repente o Piper desaparece e a sensação de tração proporcionada pelo aviãozinho cessa. Estamos flutuando, flutuando sobre a Geórgia.

Puta merda — é empolgante. O avião aderna e vira, obedecendo a inclinação da asa, e subimos em espiral em direção ao Sol. Ícaro. É isso. Estou voando perto do Sol, mas ele está comigo, conduzindo-me. Arquejo ao me dar conta disso. Ficamos subindo em espiral, e a vista com essa luz matinal é espetacular.

— Segure firme! — grita ele, e tornamos a mergulhar, só que desta vez ele não para. De repente, estou de cabeça para baixo, olhando para o solo pela cúpula da cabine.

Dou um grito estridente, abrindo os braços instintivamente, espalmando as mãos no material transparente para me segurar. Escuto sua risada. Filho da mãe! Mas sua alegria é contagiante, e estou rindo também, enquanto ele endireita o avião.

— Foi bom eu não ter tomado café! — grito para ele.

— É, foi bom, porque vamos fazer isso de novo.

Ele mergulha de novo o avião até estarmos de cabeça para baixo. Dessa vez, porque estou preparada, me seguro na mochila, mas acho isso engraçado e fico rindo feito uma idiota. Ele torna a endireitar o avião.

— Lindo, não é? — grita ele.

— É.

Voamos, dando piquês majestosos no ar, ouvindo o vento e o silêncio, na luz da manhã. Será que poderíamos pedir mais?

— Está vendo o controle na sua frente? — grita ele de novo.

Olho para a alavanca sacolejando entre minhas pernas. Ah, não, aonde ele vai com isso?

— Pegue.

Ai, merda. Ele vai me fazer pilotar o avião. Não!

Vai, Anastasia, pegue — insiste com veemência.

Hesitantemente, seguro o controle e sinto o movimento e a guinada do que presumo serem lemes e pás que mantêm o avião no ar.

— Segure firme... não deixe mexer. Está vendo o mostrador do meio na frente? Mantenha a agulha no centro.

Estou apavorada. Puta merda. Estou pilotando um planador... Estou planando.

— Muito bem — diz Christian encantado.

— Estou impressionada que você me deixe assumir o controle — grito.

— Você ficaria espantada com o que posso deixar você fazer, Srta. Steele. Agora é comigo de novo.

Sinto o controle mexer subitamente, e solto enquanto descemos em parafuso vários metros, e meus ouvidos estalam de novo. O solo está se aproximando, e parece que já, já, vamos bater lá. É assustador.

— BMA, aqui é BG N Papa Três Alfa, entrando pista esquerda a sotavento sete para a grama, BMA.

Christian fala daquele seu jeito autoritário de sempre. A torre dá uma resposta cheia de chiados pelo rádio, mas não entendo o que dizem. Tornamos a dar uma volta ampla, nos aproximando lentamente do solo. Posso ver o aeroporto, as pistas de pouso, e estamos de novo sobrevoando a Interestadual 95.

— Segure-se. Às vezes isso sacode.

Após outra volta, descemos, e, de repente, estamos no solo com um baque rápido, correndo na grama — puta merda. Bato o queixo ao sacolejarmos lá dentro a uma velocidade alarmante, até finalmente pararmos. O avião balança, depois cai para a direita. Respiro fundo e Christian se debruça e abre a cúpula da cabine, saltando e se alongando.

— Como foi? — pergunta, os olhos com um brilho prateado deslumbrante.

Ele vem me soltar.

— Foi sensacional. Obrigada — sussurro.

— Isso é mais? — pergunta ele, a voz esperançosa.

— Muito mais — respondo, e ele sorri.

— Venha.

Ele me estende a mão, e salto da cabine.

Assim que salto, ele me agarra bem colada nele. De repente, está puxando minha cabeça para trás pelos cabelos com uma das mãos, enquanto a outra desce até a cintura. Ele me dá um beijo demorado e apaixonado, explorando minha boca com a língua. Sua respiração está se acelerando, seu ardor... Puta merda — seu pênis ereto... estamos num campo. Mas não quero saber. Meus dedos se enroscam em seu cabelo, ancorando-o a mim. Eu o quero aqui, agora, no chão. Ele se afasta e me olha, os olhos misteriosos e luminosos na luz da manhã, cheios de sensualidade pura e arrogante. Nossa. Ele me tira o fôlego.

— Café — sussurra ele, falando como se essa refeição fosse algo deliciosamente erótico.

Como ele consegue fazer uma refeição de ovos com bacon soar como se fosse o fruto proibido? É um talento extraordinário. Ele se vira, me dá a mão, e voltamos para o carro.

— E o planador?

— Alguém vai cuidar disso — diz ele sem dar importância. — Vamos comer agora.

Seu tom é inequívoco.

Comida! Ele está falando de comida, quando realmente tudo que eu quero é ele.

— Venha.

Ele sorri.

Nunca o vi assim, e é uma alegria ver. De repente estou a seu lado, de mãos dadas, com um sorriso abobalhado no rosto. Isso me lembra quando eu tinha dez anos e passei o dia na Disneylândia com Ray. Foi um dia perfeito, e este com certeza está prometendo ser igual.

* * *

NO CARRO, QUANDO estamos na Interestadual 95 voltando para Savannah, o alarme do meu celular toca. Ah, sim... minha pílula.

— O que é isso? — pergunta Christian, curioso, olhando para mim.

Procuro a caixa na bolsa.

— O alarme para a pílula — murmuro, enrubescendo.

Ele sorri.

— Ótimo, muito bem. Odeio camisinha.

Fico mais vermelha ainda. Ele está mais paternalista que nunca.

— Gostei de você ter me apresentado ao Mark como sua namorada — murmuro.

— Não é o que você é?

Ele ergue uma sobrancelha.

— Sou? Pensei que você quisesse uma submissa.

— Eu também, Anastasia, e quero. Mas já disse. Eu também quero mais.

Minha nossa. Ele está caindo em si, e uma onda de esperança me invade, deixando-me ofegante.

— Estou muito feliz por você querer mais — murmuro.

— Nosso objetivo é satisfazer, Srta. Steele.

Ele dá um sorrisinho ao estacionarmos na International House of Pancakes.

Panquecas. Sorrio para ele também. Não acredito. Quem diria... Christian Grey na IHOP.

* * *

SÃO OITO E MEIA, mas o restaurante está calmo. Cheira a massa doce, fritura e desinfetante. Humm... não é um cheiro muito tentador. Christian me conduz a uma mesa.

— Eu nunca teria imaginado você aqui — digo ao nos sentarmos.

— Meu pai nos trazia a um desses restaurantes sempre que minha mãe viajava para um congresso de medicina. Era nosso segredo.

Ele sorri para mim, todo alegre, e pega um cardápio, passando a mão pelo cabelo revolto.

Ah, quero passar as mãos nesse cabelo. Pego um cardápio e o examino. Vejo que estou faminta.

— Sei o que eu quero — sussurra ele, a voz grave e rouca.

Olho para ele, que está me olhando daquele jeito misterioso e ardente que me deixa com todos os músculos da barriga contraídos e me tira o fôlego. Puta merda. Meu sangue canta nas veias, respondendo a seu chamado.

— Eu quero o que você quiser — sussurro.

Ele suspira.

— Aqui? — pergunta sugestivamente, levantando uma sobrancelha para mim, com um sorriso malicioso, os dentes prendendo a pontinha da língua.

Nossa... sexo na IHOP. A expressão dele muda, ficando mais misteriosa.

— Não morda o lábio — ordena. — Aqui, não, agora, não. — Seu olhar fica mais duro, e, por um instante, ele parece deliciosamente perigoso. — Se não posso comer você aqui, não me tente.

— Oi, meu nome é Leandra. O que vocês vão querer... hã... gente... hoje...?

Ela deixa a frase inacabada, tropeçando nas palavras ao encher os olhos com o Sr. Lindo à minha frente. Fica toda vermelha, e percebo, contrariada, que estou sentindo um pouquinho de pena dela, porque ele ainda faz isso comigo. A presença dela me permite escapar por um instante do olhar sensual dele.

— Anastasia? — ele me dá a palavra, sem fazer caso da moça, e acho que ninguém poderia pôr tanta sensualidade no meu nome como ele faz naquele momento.

Engulo em seco, rezando para não ficar da mesma cor que a pobre Leandra.

— Eu já disse, quero o que você quiser.

Falo com a voz doce, grave, e ele me olha sequioso. Minha deusa interior se derrete. Será que estou preparada para o jogo dele?

Leandra olha de mim para ele e dele para mim. Está praticamente da mesma cor do seu luzidio cabelo ruivo.

— Será que dou mais um tempinho para vocês decidirem?

— Não. Já sabemos o que queremos.

Christian dá um sorrisinho sensual.

— Vamos querer duas porções da panqueca tradicional de leite com maple syrup e bacon à parte, dois copos de suco de laranja, um café preto com leite desnatado e um chá preto, se você tiver — diz Christian, sem tirar os olhos de mim.

— Obrigada, senhor. Mais alguma coisa? — sussurra Leandra, olhando para tudo menos para nós dois.

Olhamos para ela, e ela fica de novo toda vermelha e vai saindo depressa.

— Sabe, isso realmente não é justo.

Olho a mesa de fórmica e sigo com o indicador o desenho, tentando soar displicente.

— O que não é justo?

— Como você desarma as pessoas. As mulheres. A mim.

— Desarmo você?

Sorrio com desdém.

— O tempo todo.

— É só impressão, Anastasia — diz ele afável.

— Não, Christian, é muito mais que isso.

Ele franze a testa.

— Você me desarma totalmente, Srta. Steele. A sua inocência. O fato de ir direto ao ponto.

— Foi por isso que você mudou de ideia?

— Mudei de ideia?

— É... sobre... hã... a gente?

Ele afaga o queixo pensativamente com aqueles dedos habilidosos.

— Acho que não mudei de ideia propriamente. Só precisamos redefinir nossos parâmetros, redesenhar nossas linhas de batalha, se quiser. Podemos fazer isso dar certo, tenho certeza. Quero você submissa no meu quarto de jogos. Vou punir você quando desobedecer às regras. Estas são as minhas exigências, Srta. Steele. O que diz disso?

— Então eu vou dormir com você? Na sua cama?

— É o que você quer?

— É.

— Então concordo. Além do mais, durmo muito bem quando você está na minha cama. Eu não sabia.

Ele fica sério e sua voz some.

— Achei que você me deixaria se eu não concordasse com tudo isso — sussurro.

— Eu não vou a lugar nenhum, Anastasia. Além do mais... — ele deixa a frase inacabada e, depois de pensar um pouco, acrescenta: — estamos seguindo o seu conselho, a sua definição: compromisso. Você me mandou essa definição num e-mail. E, até agora, está dando certo para mim.

— Adoro que você queira mais — murmuro timidamente.

— Eu sei.

— Como sabe?

— Pode confiar em mim. Eu simplesmente sei.

Ele dá um sorrisinho. Está escondendo alguma coisa. O quê?

Nesse momento, Leandra chega com os pratos e nossa conversa termina. Minha barriga ronca, lembrando-me de quão faminta estou. Christian observa com um olhar de aprovação irritante eu devorar a comida toda do prato.

— Posso fazer um convite? — pergunto a Christian.

— Um convite?

— Para esse café da manhã. Deixe que seja por minha conta.

Christian bufa.

— Acho que não — debocha.

— Por favor. Eu quero.

Ele amarra a cara.

— Está tentando me emascular completamente?

— Este talvez seja o único restaurante que vou poder pagar.

— Anastasia, agradeço a intenção. Mesmo. Mas, não.

Contraio os lábios.

— Não fique emburrada — ameaça ele, com um brilho sinistro nos olhos.

* * *

CLARO QUE ELE não me pergunta o endereço de minha mãe. Ele já sabe, perseguidor que é. Quando estaciona em frente à casa, não comento. Para quê?

— Quer entrar? — pergunto timidamente.

— Preciso trabalhar, Anastasia, mas estarei de volta à noite. A que horas?

Não faço caso da inoportuna pontada de decepção. Por que quero passar cada minuto com esse deus do sexo controlador? Ah, sim, eu me apaixonei por ele, e ele sabe voar.

— Obrigada... pelo mais.

— De nada, Anastasia.

Ele me beija, e aspiro aquele seu cheiro sensual.

— Até logo.

— Tente me deter — murmura ele.

Dou adeus enquanto ele sai com o carro para encarar o sol forte da Geórgia. Ainda estou usando o moletom e a cueca dele, e estou muito agasalhada.

Na cozinha, minha mãe está histérica. Não é todo dia que tem que receber um multiziliardário, e está estressada com isso.

— Como você está, querida? — pergunta, e coro porque ela sabe o que eu fiz ontem à noite.

— Tudo bem. Christian me levou para voar de planador hoje de manhã.

Espero que a informação nova a distraia.

— Voar de planador? Tipo num aviãozinho sem motor? É isso?

Faço que sim com a cabeça.

— Nossa.

Ela está sem fala — um conceito novo para minha mãe. Olha para mim boquiaberta, mas acaba se recuperando e retoma a linha de interrogatório original.

— Como foi ontem à noite? Vocês conversaram?

Putz. Fico vermelha como um pimentão.

— A gente conversou, ontem à noite e hoje. Está melhorando.

— Ótimo.

Ela volta a atenção de novo para os quatro livros de culinária que tem abertos na mesa da cozinha.

— Mãe... se quiser, eu faço o jantar.

— Ah, querida, é muita gentileza sua, mas eu quero fazer.

— Tudo bem.

Faço uma careta, sabendo muito bem que a comida de minha mãe nem sempre presta. Talvez ela tenha melhorado desde que se mudou para Savannah com Bob. Houve uma época em que eu não sujeitaria ninguém ao que ela cozinha... nem — quem eu odeio? Ah, sim — a Mrs. Robinson, Elena. Bem, talvez ela. Será que algum dia vou conhecer essa mulher desprezível?

Decido mandar um agradecimento rápido a Christian.

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De: Anastasia Steele

Assunto: Planar, e não pagar

Data: 2 de junho de 2011 10:20 LESTE

Para: Christian Grey


Às vezes você sabe fazer uma moça se divertir.


Obrigada.


Bj, Ana

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De: Christian Grey

Assunto: Planar versus pagar

Data: 2 de junho de 2011 10:24 LESTE

Para: Anastasia Steele


Prefiro fazer as duas coisas a ouvir seu ronco. Também me diverti muito.


Eu sempre me divirto com você.


Christian Grey


CEO, Grey Enterprises Holdings, Inc.

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De: Anastasia Steele

Assunto: Roncar

Data: 2 de junho de 2011 10:26 LESTE

Para: Christian Grey


EU NÃO RONCO. E se roncasse, seria muito grosseiro de sua parte assinalar isso.


Você não é nada cavalheiro, Sr. Grey! E está no Extremo Sul, também!


Ana

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De: Christian Grey

Assunto: Sonilóquio

Data: 2 de junho de 2011 10:28 LESTE

Para: Anastasia Steele


Nunca pretendi ser cavalheiro, Anastasia, e acho que já lhe demonstrei este ponto em várias ocasiões. Não me intimido com suas maiúsculas GRITANTES. Mas confesso uma mentirinha: não, você não ronca, mas fala. E isso é fascinante.


O que aconteceu com meu beijo?


Christian Grey


CEO, Grey Enterprises Holdings, Inc.


Puta merda. Sei que falo dormindo. Kate já me disse isso várias vezes. O que eu disse? Ah, não.

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De: Anastasia Steele

Assunto: Entregar o ouro

Data: 2 de junho de 2011 10:32 LESTE

Para: Christian Grey


Você é um calhorda e um patife — definitivamente não um cavalheiro.

Então, o que eu disse?


Nada de beijos até você falar!

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De: Christian Grey

Assunto: Bela adormecida falante

Data: 2 de junho de 2011 10:35 LESTE

Para: Anastasia Steele


Seria muito grosseiro de minha parte dizer, e já fui castigado por isso.


Mas se você se comportar, talvez eu lhe conte hoje à noite. Preciso entrar em reunião agora.


Até mais, baby.


Christian Grey


CEO, Calhorda e Patife, Grey Enterprises Holdings, Inc.

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Certo! Manter silêncio até a noite. Estou possessa. Droga. Suponhamos que eu tenha dito dormindo que o odeio, ou pior ainda, que o amo. Ah, espero que não. Não estou pronta para dizer isso a ele, e tenho certeza de que ele não está pronto para ouvir, se é que algum dia vai querer ouvir. Olho de cara feia para meu computador e decido que, seja o que for que mamãe prepare, vou fazer pão para descarregar minhas frustrações enquanto sovo a massa.

* * *

MINHA MÃE DECIDIU por um gaspacho e depois filés grelhados marinados em azeite, alho e limão. Christian gosta de carne, e isso é simples de fazer. Bob se ofereceu para tomar conta da churrasqueira. O que há em relação aos homens e o fogo?, reflito ao me arrastar com o carrinho de compras atrás de minha mãe pelo supermercado.

Enquanto olhamos a gôndola de carnes cruas, meu telefone toca. Procuro-o com pressa, achando que pode ser Christian. Não reconheço o número.

— Alô? — respondo ofegante.

— Anastasia Steele?

— Sim.

— É Elizabeth Morgan, da SIP.

— Ah, oi.

— Estou ligando para lhe oferecer o cargo de assistente do Sr. Jack Hyde. Gostaríamos que começasse na segunda-feira.

— Nossa. Que maravilha. Obrigada!

— Sabe os detalhes do salário?

— Sim. Sim... é... quero dizer, eu aceito a oferta. Eu adoraria ir trabalhar para vocês.

— Excelente. Então até segunda-feira às oito e meia?

— Até segunda. Até logo. E obrigada.

Abro um sorriso rasgado para minha mãe.

— Está empregada?

Balanço a cabeça com alegria, e ela dá gritinhos e me abraça no meio do supermercado.

— Parabéns, querida! Temos que comprar champanhe!

Ela está saltitante, batendo palmas. Será que tem quarenta e dois ou doze anos?

Olho para meu telefone e fico intrigada. Há uma ligação perdida de Christian. Ele nunca me liga. Ligo para ele na mesma hora.

— Anastasia — ele atende imediatamente.

— Oi — murmuro tímida.

— Tenho que voltar a Seattle. Aconteceu um imprevisto. Estou indo para Hilton Head agora. Por favor, peça desculpas a sua mãe, não vai dar para eu ir ao jantar.

Ele fala num tom profissional.

— Nada sério, espero.

— Estou com um problema que preciso resolver. Vejo você amanhã. Mando o Taylor buscá-la no aeroporto se eu não puder ir.

Sua voz é fria. Até zangada. Mas, pela primeira vez, não vou logo pensando que é por minha causa.

— Tudo bem. Espero que resolva seu problema. Boa viagem.

— Para você também, baby — sussurra ele e, com essas palavras, meu Christian está de volta. E então desliga.

Ah, não. O último “problema” que ele teve foi minha virgindade. Espero que não seja nada parecido com isso. Olho para minha mãe. Sua alegria de há pouco se transformou em preocupação.

— É o Christian. Ele teve que voltar para Seattle. Pede desculpas.

— Ah! Que pena, querida. Podemos assim mesmo fazer nosso churrasco, e agora temos uma coisa para comemorar: seu emprego novo! Você tem que me contar tudinho a respeito.

* * *

É FIM DE TARDE, e mamãe e eu estamos deitadas à beira da piscina. Minha mãe está tão relaxada que está literalmente na horizontal agora que o Sr. Ricaço não vem jantar. Estirada ao sol, esforçando-me para perder a brancura, penso em ontem à noite e no café da manhã de hoje. Penso em Christian, e meu sorriso ridículo se recusa a desaparecer. Ele fica se insinuando para mim, inoportuno e desconcertante, quando me lembro de nossas várias conversas e no que fizemos... no que ele fez.

A atitude de Christian parece ter mudado radicalmente. Ele nega isso, mas admite estar se esforçando por mais. O que poderia ter mudado? O que mudou desde aquele seu longo e-mail e desde ontem? O que ele fez? Sento-me de repente, quase derramando o refrigerante. Ele jantou com... ela. Elena.

Puta merda!

A ideia me deixa de cabeça quente. Será que ela lhe disse alguma coisa? Ah... eu queria ser uma mosca durante o jantar deles. Eu poderia ter pousado na sopa ou no copo de vinho dela e a sufocado.

— O que é, Anastasia, querida? — pergunta mamãe, sobressaltada daquele seu torpor.

— Só um instantinho, mãe. Que horas são?

— Umas seis e meia, querida.

Hum... ele ainda não deve ter pousado. Será que posso perguntar a ele? Será que devo? Ou vai ver que ela não tem nada a ver com isso. Espero realmente que não tenha. O que eu disse dormindo? Merda... algum comentário imprudente enquanto sonhava com ele, aposto. Seja o que for, ou tenha sido, espero que a mudança parta dele, não que seja causada por ela.

Estou sufocando nesse calor desgraçado. Preciso dar outro mergulho na piscina.

* * *

ENQUANTO ME PREPARO para dormir, ligo o computador. Não tenho nenhuma notícia de Christian. Nem uma palavra dizendo que chegou bem.

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De: Anastasia Steele

Assunto: Chegou bem?

Data: 2 de junho de 2011 22:32 LESTE

Para: Christian Grey


Prezado Senhor,

Queira me informar se chegou bem. Começo a ficar preocupada. Pensando em você.


Bj,

Sua Ana


Três minutos depois, ouço o tilintar da minha caixa de entrada.

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De: Christian Grey

Assunto: Perdão

Data: 2 de junho de 2011 19:36

Para: Anastasia Steele


Prezada Srta. Steele,

Cheguei bem, e queira aceitar minhas desculpas por não informá-la disso. Não quero lhe causar nenhuma preocupação. É reconfortante saber que me quer bem. Estou pensando em você, e, como sempre, ansioso para vê-la amanhã.


Christian Grey


CEO, Grey Enterprises Holdings, Inc.


Suspiro. Christian está formal de novo.

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De: Anastasia Steele

Assunto: O problema

Data: 2 de junho de 2011 22:40 LESTE

Para: Christian Grey


Prezado Sr. Grey,

Acho que está muito claro que lhe quero muito bem. Como poderia duvidar disso?


Espero que seu “problema” esteja sob controle.


Bjs,


Sua Ana


P.S.: Vai contar o que eu disse dormindo?

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De: Christian Grey

Assunto: Direito de permanecer calado

Data: 2 de junho de 2011 19:45

Para: Anastasia Steele


Prezada Srta. Steele,

Fico muito feliz por você me querer bem. O “problema” ainda não foi resolvido.


Quanto ao seu P. S., a resposta é não.


Christian Grey


CEO, Grey Enterprises Holdings, Inc.

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De: Anastasia Steele

Assunto: Alegação de insanidade

Data: 2 de junho de 2011 22:48 LESTE

Para: Christian Grey


Espero que tenha sido divertido. Mas você tem que saber que não me responsabilizo por nada que saia da minha boca quando estou inconsciente. Na verdade, você provavelmente me ouviu mal.


Um homem com sua idade avançada com certeza é um pouco surdo.

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De: Christian Grey

Assunto: Declaro-me culpado

Data: 2 de junho de 2011 19:52

Para: Anastasia Steele


Prezada Srta. Steele,

Perdão, poderia falar mais alto? Não consigo ouvi-la.


Christian Grey


CEO, Grey Enterprises Holdings, Inc.

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De: Anastasia Steele

Assunto: Alegação de insanidade de novo

Data: 2 de junho de 2011 22:54 LESTE

Para: Christian Grey


Você está me enlouquecendo.

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De: Christian Grey

Assunto: Espero que sim...

Data: 2 de junho de 2011 19:59

Para: Anastasia Steele


Prezada Srta. Steele,


É exatamente o que pretendo fazer sexta-feira à noite. Aguardo este momento com ansiedade.


;)


Christian Grey


CEO, Grey Enterprises Holdings, Inc.

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De: Anastasia Steele

Assunto: Grrrrr

Data: 2 de junho de 2011 23:02 LESTE

Para: Christian Grey


Estou oficialmente puta com você.


Boa noite.


Srta. A. R. Steele

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De: Christian Grey

Assunto: Gata selvagem

Data: 2 de junho de 2011 20:05

Para: Anastasia Steele


Está rosnando para mim, Srta. Steele?


Tenho o meu gato para rosnar.


Christian Grey


CEO, Grey Enterprises Holdings, Inc.


Gato dele? Nunca vi gato no apartamento dele. Não, não vou lhe responder. Ah, às vezes ele consegue ser muito irritante. Irritante em Cinquenta Tons. Vou para a cama e fico olhando para o teto enquanto minha vista se adapta ao escuro. Ouço o computador tilintar de novo. Não vou olhar. Não, definitivamente não. Não, eu não vou olhar. Droga! Idiota que sou, não consigo resistir à atração das palavras de Christian Grey.

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De: Christian Grey

Assunto: O que você disse dormindo

Data: 2 de junho de 2011 20:20

Para: Anastasia Steele


Anastasia,


Eu preferiria ouvir você dizer as palavras que disse dormindo quando está consciente, por isso não vou lhe contar. Vá dormir. Com o que tenho em mente para você amanhã, precisará estar descansada.


Christian Grey


CEO, Grey Enterprises Holdings, Inc.


Ah, não... O que eu disse? É tão ruim quanto imagino, tenho certeza.

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